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Folclore e superstição arrepiam em Joanópolis
Cidade a 115 km de SP é a capital do lobisomem graças a historiadora joanopolense
LUIZ ANTONIO DEL TEDESCO
ENVIADO ESPECIAL A JOANÓPOLIS (SP)
Pouco antes de chegar a Joanópolis, o turista já pode avistar a cidade da sinuosa e agradável (e asfaltada, para os que se preocupam
com isso) estrada que faz a ligação
com a rodovia Fernão Dias. Encravada num vale nos contrafortes da Mantiqueira, a singela e
acolhedora cidade, a 115 km da
capital paulista, de pouco mais de
10 mil habitantes, tem um povo
simpático e gentil, carroças circulando pela praça da matriz, o coreto, a antiga farmácia (São João)
com suas estantes centenárias
bem conservadas, o belo grupo
escolar que leva o nome de um de
seus fundadores e tudo o mais
que caracteriza qualquer pequenina cidade do interior.
Mas então por que ela, bem ela,
fundada no dia de são João, um
dos santos mais queridos e populares do país, se transformou na
"capital do Lobisomem"?
Tudo começou em 1983, quando a folclorista Maria do Rosário
de Souza Tavares de Lima apercebeu-se de que na cidade havia
uma quantidade enorme de histórias que tratavam do lobisomem e
resolveu investigar o assunto mais
a fundo. Decidiu, então, preparar
a tese que a levaria a integrar a Associação Brasileira de Folclore,
que tem Mario de Andrade como
um de seus fundadores, e que acabaria resultando no livro "Lobisomem: Assombração e Realidade".
Daí bastou um salto para o lobisomem tornar-se o atrativo maior
da cidade que surgiu de um arraial de são João em 24 de junho
de 1878, quando moradores do
bairro Curralinho, da vizinha Piracaia, resolveram erguer uma capela em homenagem ao santo.
É então uma heresia que a cidade que homenageia um tal santo
até no nome seja a capital dessa
fera? Nem tanto.
"O nosso lobisomem não é
mau, é antes uma figura simpática. O lobisomem brasileiro é apenas alguém que está pagando seu
fadário, só assusta as pessoas porque passa correndo perto delas",
explica o historiador e "lobisomólogo" Valter Cassalho, vice-presidente da Associação dos Criadores de Lobisomens e um dos
maiores incentivadores do mito
na cidade e na região.
Fundada em 1988, a associação
"cataloga, divulga e mantém a
parte folclórica do mito, para que
não se transforme simplesmente
em comércio", explica Cassalho.
Os integrantes da ACL promovem palestras nas escolas, teatros
de fantoche e outras ações educativas para incentivar o conhecimento do folclore e da cultura locais e o turismo. E por onde se caminha por Joanópolis dá para ver
que a "lobisomania" pegou.
Conversas sobre lobisomens
são uma constante nos bares e nas
praças. Miniaturas simpáticas do
temível ser e camisetas em homenagem a ele são encontradas em
qualquer loja. E até é possível tomar uma boa talagada de "repelente de lobisomem" na padaria
que fica na praça da matriz.
E o melhor lugar para o turista
inteirar-se sobre o mito é a Casa
do Artesão, na praça da matriz,
que funciona como sede da ACL e
é onde os artesãos locais exibem
seus trabalhos, feitos quase exclusivamente com material reciclado/reciclável -cascas, folhas e
troncos de árvores encontrados
caídos no mato.
Para o turista que não se satisfaz
apenas com os "causos" contados
e deseja um contato mais "íntimo" com a fera, a pousada Monteleone, situada às margens da represa Jacareí-Jaguari, realiza a trilha do lobisomem.
"Nas noites de sábado, juntamos os hóspedes e alguns funcionários e saímos ao encalço do bicho", conta Paulo Bonandi, 48,
proprietário da pousada.
O objetivo é criar um clima de
mistério. "Depois de terminada a
trilha, alguns hóspedes vêm me
dizer que havia muito tempo não
sentiam medo assim", diz Bonandi, ressaltando que o lobisomem
da cidade é brincalhão, mas aquele que vagueia pelas cercanias da
pousada é amedrontador.
"Os dois lobisomens que por
vezes aparecem para jantar nos
fins de semana costumam pregar-nos boas peças", acrescenta.
Houve um tempo em que jipeiros da cidade organizavam uma
caçada ao lobisomem nas noites
de lua cheia, mas, por falta de verba, a incursão está temporariamente suspensa.
Luiz Antonio Del Tedesco hospedou-se a convite da pousada Monteleone
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