São Paulo, segunda-feira, 29 de julho de 2002

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TERRA DE FRONTEIRAS

Da região, na divisa com Portugal, saíram conquistadores do Novo Mundo

América tem doses de Extremadura

Ricardo Bonalume Neto/ Folha Imagem
Mosteiro de Santa Maria de Guadalupe, na Extremadura, região pouco conhecida por turistas e que presenciou batalhas entre diversos povos


RICARDO BONALUME NETO
ENVIADO ESPECIAL À EXTREMADURA

Os lugares mais fascinantes do planeta costumam ser terras de fronteira. São locais de encontros de civilizações, nem sempre pacíficos. Aliás, quase nunca pacíficos. Mas o resultado é sempre uma mistura cultural rara, que merece ser estudada. E visitada.
É o caso da Extremadura, região da Espanha que a maioria dos turistas teria dificuldade em achar no mapa, talvez por ainda não ser alvo do turismo de massa.
O próprio nome dessa comunidade autônoma, constituída por duas Províncias, Cáceres e Badajoz, é ilustrativo. Extremadura, no extremo oeste espanhol, é tanto a terra além do rio Douro (Duero, em espanhol), como uma terra de "extrema dureza".
A região fazia fronteira com o rival reino cristão de Portugal e com os mouros ao sul. É terra que viu combates entre romanos e bárbaros, árabes e visigodos, cristãos e mouros, portugueses e espanhóis, britânicos e franceses.
Meio caminho entre Lisboa e Madri, a Extremadura e o vizinho Alentejo -outro nome de fronteira, "além do Tejo"- eram locais de batalhas e sítios de fortalezas e castelos. Hoje, a moeda comum e a fronteira sem barreiras tornam fácil passar de um lado ao outro desses dois países, separados por duas línguas irmãs, juntos pela mesma história e religião.
Visitar a Extremadura é também conhecer um pouco mais de outra fronteira, o Novo Mundo. Pois foi dali que vieram os conquistadores de boa parte da América Latina, mesmo do Brasil.
Os guias turísticos tentam ser politicamente corretos e chamam os extremenhos Hernán Cortés (1485-1547), nascido em Medellín, Francisco Pizarro (c. 1475-1541) e Francisco de Orellana (1511-1546), ambos de Trujillo, de "descobridores". Bobagem. Eram guerreiros cruéis, de um povo forjado na luta contra o "infiel" muçulmano, e soltos com ferozes cães de guerra nas Américas. Mataram, massacraram, pilharam. Mas não faz sentido julgar o século 16 com a visão do século 21.
Cortés conquistou, não apenas "descobriu", o México; Pizarro fez o mesmo com o Peru. Seu parente Orellana foi o primeiro europeu a trafegar todo o rio Amazonas, batizado por um frei da Extremadura, Gaspar de Carvajal, que o acompanhou e que provavelmente interpretou errado a cabeleira de alguns índios belicosos.
Essa terra de fronteira criou homens que marcaram a história. Vásco Núñez de Balboa (1475-1517), de Jerez de los Caballeros, cruzou o istmo do Panamá e "descobriu" o Pacífico ali. Pedro de Valdivia (1510-1569), de Villanueva de la Serena, fundou Santiago e batizou a região de Nova Extremadura; o nome não pegou, e o país hoje se chama Chile.
Há um pouco de Extremadura na história de cada latino-americano. Isso já bastaria para querer visitá-la.

Ricardo Bonalume Neto viajou a convite do Centro Oficial do Turismo Espanhol, do Turismo de Extremadura e da companhia aérea Iberia


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