São Paulo, segunda-feira, 29 de outubro de 2001

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REVIVA MÉXICO
Guillermo Kahlo, pai de Frida, retratou a riqueza do período entre a conquista e a revolução

Fotógrafo dá rota de país esquecido

Reprodução/"Guillermo Kahlo - Fotógrafo Oficial de Monumentos"
Catedral Metropolitana da Cidade do México, fotografada por Guillermo Kahlo


FRANCESCA ANGIOLILLO
ENVIADA ESPECIAL AO MÉXICO

Quando se pensa no México, é comum que duas imagens venham à cabeça: as pirâmides pré-colombianas e a arte de Frida Kahlo (1907-1954) e do grupo de muralistas de que fez parte seu marido, Diego Rivera (1886-1957).
No entanto há outro lado do país que, se menos "exótico" do que o evocado pelos exemplos acima, merece menção e visita. Ele nasce justamente entre os dois períodos citados -a origem indígena e a revalorização dessa mesma origem-, durante o longo caminho que fundiu a cultura anterior à conquista e os hábitos inseridos pelos espanhóis.
Foi sobre essa mescla que se ergueu o México colonial, cuja mais notável expressão arquitetônica está nas igrejas do barroco churrigueresco (século 18), com decorações que misturam traços autóctones e refinamento espanhol.
O maior retratista de igrejas e monumentos que trazem a mescla cultural do período colonial foi o pai da pintora Frida: o fotógrafo alemão, de origem húngara, Guillermo Kahlo (1872-1941).
Os registros biográficos de Kahlo são um tanto quanto nebulosos. É certo, porém, que ele desenvolveu uma epilepsia na juventude, afastando-se dos estudos. Esse fato, combinado à morte da mãe e à não-aceitação do segundo casamento do pai, o levou ao México.
Assim, em 1891, aos 19 anos, deixou de ser Wilhelm para ser Guillermo. Ao chegar ao México, trabalhou como contador em negócios de compatriotas já estabelecidos na capital do país -lidar com números não exigia o domínio do espanhol.
Também são nebulosas as origens do interesse de Kahlo pela fotografia. A versão mais aceita diz que ele aprendeu o ofício com o seu segundo sogro, Antonio Calderón -Kahlo casou-se pela primeira vez, em 1893, com Maria Cardeña. Teve com ela duas filhas, Maria Luísa e Margarita. Foi no parto da segunda que morreu Cardeña, em 1897.
Em 1898, Kahlo se casaria com Matilde Calderón, mãe de Matilde, Adriana, Frida e Cristina, além de um menino morto com poucos meses de idade.
A primeira foto firmada por Kahlo de que se tem notícia data de fevereiro de 1899 e seu primeiro encargo na nova profissão foi o registro da construção do edifício Boker, sede de uma casa de importação, entre 1899 e 1900.
Nos primeiros anos do século 20, tendo adotado a fotografia, Kahlo realizou alguns trabalhos como repórter fotográfico. Retratos nunca o seduziram, mas também os fez, pois eram o ganha-pão mais comum da maior parte dos fotógrafos de seu tempo.
Dizem que Kahlo justificava sua falta de gosto por fotografar pessoas repetindo que não queria consertar o que Deus fizera feio. Assim, preferia fotografar o que fora construído pelo homem com o fim de ser belo: arquitetura.
Tal interesse lhe traria algum renome. Seus registros de ruas e edifícios da Cidade do México renderiam encargos durante o Porfiriato -governo do ditador Porfirio Díaz, que vai de 1876, quando é empossado presidente, a 1911, quando é derrubado pela Revolução Mexicana, com um intervalo entre 1880 e 1884.
Em 1904, o ministro da Fazenda, José Yves Limantour, encomendou a Kahlo um inventário das igrejas do México colonial. Trabalhando para o governo, Kahlo fez perto de 2.000 fotos de monumentos do México colonial, entre 1904 e 1908.
O resultado foi compilado em uma coleção de livros, hoje quase impossíveis de serem encontrados, com temas como "altares do México" ou "tipos poblanos".
A série foi oferecida como presente comemorativo do centenário da Independência do México, em 1910. Consumado em 1821, o processo que acabaria com os tempos de colônia foi deflagrado com o lendário grito de "Viva México!" dado pelo padre Miguel Hidalgo em 1810. Hidalgo foi morto, e o levante reprimido, mas a data do grito -a noite de 15 para 16 de setembro- é considerada a do nascimento da nação mexicana.
Trabalhando com equipamento pesado -câmeras de fole cujos negativos eram placas de vidro-, Kahlo acabou tendo seu território de trabalho delimitado pela linha ferroviária. Hoje, os trens mexicanos quase já não levam passageiros, mas é possível conhecer várias preciosidades registradas pelo pai de Frida viajando de ônibus ou de carro, em roteiros rápidos que partem da Cidade do México.

Francesca Angiolillo viajou a convite da AeroMéxico


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