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Marcia apela para bate-bocas e relatos de desgraças
DA REPORTAGEM LOCAL
"NÃO AGUENTO mais conviver
com um tarado." A frase, estampada na tela da Bandeirantes em um fim
de tarde, há alguns dias, mostrava o tema
do dia do debate comandado por Marcia
Goldschmidt, levado ao ar diariamente
pelo canal. Uma moça dava seu depoimento, e a legenda mudava para: "Meu
primo é viciado em sexo".
Uma das apostas da Band para sua nova programação, que estreou há um mês,
em busca de um aumento da audiência
da emissora, o "Hora da Verdade" já
mostrou que é, de fato, uma reedição do
telebarraco "Márcia", exibido pelo SBT
entre 97 e 98.
O programa, que tem como proposta
"mostrar dramas pessoais e ser um espaço de denúncia e defesa do consumidor",
segundo o diretor de programação da
Band, Rogério Gallo, invariavelmente
acaba com um bate-boca entre as partes
envolvidas. Há alguns dias, por exemplo,
um patrão e seus ex-funcionários, demitidos supostamente sem razão, discutiam no programa -"Você não pagou
nossos direitos", "Paguei", "Não chama
a gente de palhaço"-, enquanto apareciam na tela legendas como "Ei! Patrão,
tô na rua. Cadê meus direitos?".
Dias depois, era a vez de uma família se
digladiar na frente das câmeras. A mulher acusava o marido de a espancar, o
marido rebatia: "A mulher quando presta não apanha". Mães, sobrinhos, vizinhos esquentavam a briga. E as tradicionais legendas: "Desespero! Mulheres espancadas querem vingança!".
Para participar da atração, é preciso se
inscrever por meio de um número de telefone divulgado durante a programação
da emissora. São convidados a ligar para
fazer parte do "Hora da Verdade" quem
se encaixa em categorias do tipo "Meu
pai é gay", "Meu companheiro é um
grosseirão", "Minha ex me inferniza" ou
"Fui traída e fui a última a saber".
Mas, às vezes o baixo nível do programa não fica apenas no campo verbal. No
último dia 14, por exemplo, sob o título
"Ei, doutor! Paguei para ficar mais feia",
pessoas que tiveram problemas com
operações plásticas foram ao programa
mostrar suas deformidades na tela e
"exigir justiça". O que se seguiu foi um
festival de imagens de virar o estômago.
Uma mulher levou fotos de sua barriga
necrosada, que eram exibidas em close
vezes seguidas -depois de serem mostradas fotos em que aparecia completamente nua, antes da operação.
"Eu sei que é uma imagem chocante.
Mas mais chocante é o que aconteceu
com aquelas pessoas. Eu não gosto de
mostrar deformidades no programa,
mas essas foram causadas por erros médicos, é preciso alertar as pessoas", disse
Marcia à Folha.
Mas, apesar do discurso da apresentadora, o que foi mostrado ia além de um
serviço à comunidade. Em dado momento, uma foto de um rapaz, aparentemente normal, foi colocada no ar. "Ele
foi fazer uma simples operação no nariz.
Daqui a pouco vou mostrar como ele ficou. É muito chocante, gente. São cenas
fortes. Não sei em que momento do programa vou mostrar", dizia Márcia.
Depois dos comerciais, as cenas: um
rapaz sem nariz, com o rosto em carne
viva, era mostrado na tela.
Em seguida, entra no palco uma vítima
de um erro médico em uma operação
nos seios. Visivelmente transtornada, a
mulher mal chegou e já foi levantando a
blusa para mostrar suas cicatrizes. "Por
favor, nós não podemos mostrar isso no
programa. Por favor", pedia a apresentadora -enquanto a câmera captava,
também em close, os seios da mulher.
Apesar de toda a apelação, o programa
não tem desempenhos muito melhores
que seu antecessor no horário, o "reality
show" "Território Livre" -tirado do ar
por causa da baixa audiência.
Com algumas exceções, o "Hora da
Verdade" raramente ultrapassa os dois
pontos de média no Ibope (cada ponto
corresponde a cerca de 80 mil telespectadores na Grande São Paulo).
(CLÁUDIA CROITOR)
HORA DA VERDADE - Bandeirantes, 17h
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