São Paulo, Domingo, 02 de Maio de 1999
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MALDIÇÃO DO IMPEACHMENT
Minissérie da Rede Manchete proibida pela Justiça não está mais nos arquivos da emissora
Fitas de "O Marajá" desaparecem

ALEXANDRE MARON
da Reportagem Local

Depois das mortes de Leda e Pedro Collor e do misterioso assassinato de Paulo César Farias, a maldição do impeachment ataca outra vez. As fitas da minissérie "O Marajá" sumiram do arquivo da Rede Manchete, no Rio de Janeiro.
"O Marajá" foi uma minissérie produzida pela Manchete, em 1993, que contava, em tom de sátira, como foi o impeachment do ex-presidente da República Fernando Collor, que acontecera um ano antes, em agosto de 1992.
Prevendo que haveria processos por parte de Collor, Adolpho Bloch, o presidente da emissora, contratou uma advogada para auxiliar os autores José Louzeiro, Regina Braga e Alexandre Lydia na tarefa de escrever a história, evitando complicações com a Justiça.
Assim, Collor virou Elle. O personagem é o presidente de um país fictício que arma um esquema para se manter no poder por 30 anos, o projeto 2020.
Elle foi interpretado pelo ator Helcio Magalhães, que encarnava Collor em comícios pró-impeachment (leia texto abaixo). A dona-de-casa Vânia Bellas tornou-se Ella, aludindo a Rosane Collor.
"Era um conceito revolucionário. Uma mistura de jornalismo com dramaturgia. Apresentávamos uma cena inacreditável e depois provávamos a veracidade com um depoimento", diz Louzeiro.
Mesmo com todo o cuidado e auxílio jurídico, a estréia, marcada para 26 de julho de 1993, não aconteceu. "O Marajá" foi proibida. O ex-presidente alegou que considerava sua honra arranhada pelas cenas da minissérie.
Após meses e uma guerra de liminares, uma decisão judicial favorável a Collor selou o destino da obra. "A história toda nos mostrou que, mesmo depois do impeachment, Collor ainda tem poder, já que foi capaz de censurar uma obra antes de ela ser exibida", lamenta Lydia.
Há, até aqui, somente uma pista do paradeiro das fitas. O ex-diretor-geral da Manchete, Fernando Barbosa Lima, afirma que o próprio Adolpho Bloch decidiu guardar as fitas, com medo que elas fossem roubadas, e a Manchete, prejudicada.
"Ele ficou assustado com o poder de Collor", conta Barbosa Lima, que era amigo de Bloch.
Com a morte de Bloch, em 1995, a emissora passou para as mãos de Pedro Jack Kapeller e as fitas estariam em seu poder. Procurado pela Folha, Kapeller não respondeu.

A história
A Folha teve acesso ao texto integral da minissérie (em 50 partes) e a um capítulo editado -uma cópia em VHS feita quando a obra ainda estava em produção, antes do desaparecimento das fitas.
A história é contada por um narrador, um repentista e uma fofoqueira, na tentativa de se comunicar com públicos diferentes. O resultado é confuso. São idas e vindas entre depoimentos jornalísticos, dramaturgia e os narradores.
Embora centrada em Elle, a protagonista de "O Marajá" é a jornalista Mariana (Julia Lemmertz). Ela namora André (Alexandre Borges), que seria o equivalente ao piloto de PC Farias, Jorge Bandeira.
Numa festa, ela ouve algo sobre o "plano 2020" e começa a investigá-lo, descobrindo que Elle pretende governar o país por 30 anos. O chefe de Mariana é então chantageado e a demite da TV Candango.
Ela se junta ao fotógrafo Tato (Antonio Pitanga), que tem fotos comprometedoras, e ao motorista de Elle, Egberto -José Dumont, encarnando o motorista Eriberto- , que leva cheques fantasmas e decide desmascarar o chefe.
Os três passam a ser perseguidos e ameaçados tentando provar a culpa de Elle. A trama, que começa tentando ser fiel aos acontecimentos, ganha tons de uma novela comum.
"Senti que, após a proibição, os autores ficaram sem tesão. A história perdeu o rumo", afirma Jussara Freire, que encarnou Felícia, paródia de Denilma Bulhões, ex-mulher do ex-governador de Alagoas.


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