São Paulo, domingo, 03 de setembro de 2000

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VÍDEO
Filme vencedor de cinco Oscars chega às locadoras encarnando estereótipo ianque
A beleza americana de Mendes

TIAGO MATA MACHADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

NOS ANOS 50, no estertor de seus bons tempos, o cinema americano dedicava-se a fazer a metáfora da perversão do "american way of life". Hoje, em sua melhor tendência, a cinematografia americana vive a fase, digamos, do cinema-verdade da patologia ianque.
Nesse sentido, os personagens mais interessantes de "Beleza Americana" são, justamente, os mais estereotipados: uma corretora ambiciosa e falsa (Annette Bening), a encarnação do arrivismo americano, e um militar aposentado (Chris Cooper), a encarnação do fascismo americano. Se ambos gostam de armas é porque recalcam, atrás do autocontrole e da rigidez -seja a da afetação (no caso dela), seja a da disciplina (no caso dele)-, todo o instinto destrutivo da América. A primeira é mãe de Jane (Thora Birch), uma adolescente deslocada que acha deplorável e mesmo patético ver o pai (Kevin Spacey) babar diante de sua melhor amiga. O segundo é pai de Ricky (Wes Bentley), um voyeur traficante de maconha que aprendeu, depois de muito apanhar, a lidar passiva e cinicamente com o fascismo do pai. O jovem casal representa, em suas mórbidas tendências, uma nova geração, a de cineastas talentosos como Harmony Korinne ("Gummo") e Todd Solondz ("Felicidade"), capazes de retratar a patologia americana por dentro, uma vez que cresceu aprendendo a ver "a beleza das coisas mortas", beleza mórbida que se contrapõe à "beleza americana", à "imagem do sucesso" que obceca a América. Mas, se "Beleza Americana" faturou o Oscar, não foi, propriamente, por satisfazer essa tendência do público jovem. Cheguemos então a Lester (Spacey), um perdedor com espírito que se apaixona pela amiga da filha, a "beleza americana" em pessoa. Em sua irresistível redenção de marombeiro, Lester evidencia aquele que é o golpe mais baixo desse brilhante roteiro, sua piscadela em direção ao público médio e ao Oscar. Não é senão aqui que ele deixa de ser uma crítica implacável ao dito "american way" para se tornar a história da morte anunciada de um simpático e redimido perdedor.


BELEZA AMERICANA
CIC
(American Beauty). EUA, 1999. Direção: Sam Mendes. Com Kevin Spacey, Annette Bening, Thora Birch e Wes Bentley. 121 minutos. Drama.


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