São Paulo, Domingo, 05 de Setembro de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Além de conquistar uma boa audiência, como suas antecessoras produzidas no México e exibidas pelo SBT, "A Usurpadora" recebe elogios de atores, roteiristas e "noveleiros" brasileiros, com sua trama convencional e familiar
Novela mexicana amplia seu sucesso

ANDRÉA DE LIMA
da Reportagem Local

O sucesso da novela "A Usurpadora" vem surpreendendo e não mais se restringe só aos números do Ibope. Além de agradar aos telespectadores, vem conquistando prestígio entre anunciantes e especialistas em novelas, algo inédito na trajetória das produções mexicanas exibidas no Brasil.
Mesmo com seus diálogos primários e sua produção pouco sofisticada, por não apelar para o sexo e a violência e caprichar nas tramas simples baseadas no romance clássico, vem fazendo com que atores e diretores consagrados no Brasil reconheçam nas novelas mexicanas qualidades hoje raras na teledramaturgia nacional.
No ar pelo SBT desde junho, de segunda a sexta, às 20h, a novela mexicana está aumentando progressivamente sua audiência no horário nobre e batendo recorde nos EUA, onde é transmitida desde o início do primeiro semestre.
"A Usurpadora" foi exibida pela primeira vez em 98, no México, pela XEW TV, emissora do grupo Televisa, responsável pela produção.
Especialistas em novelas afirmam que "A Usurpadora" é um autêntico resgate dos folhetins franceses do século 19, das radionovelas cubanas e das fotonovelas brasileiras.
O novelão, como é conhecido na América Latina, tornou-se tema de estudos acadêmicos. O mestre em novelas pela USP, Mauro Alencar, 37, é um de seus defensores.
"Adoro "A Usurpadora". A protagonista, Gabriela Spanic, é lindíssima. Vi em vários países o poder de atração dessa novela", diz.
Ele descreve que é no cenário "paradisíaco" de Cancún, "o mais belo balneário mexicano", que se passa o folhetim melodramático, as mazelas da sociedade dividida entre ricos e pobres.
"As pessoas têm de entrar nesse jogo de teleficção, onde a trama se torna verossímil. Acredito que falta um pouco de edição de imagens à "A Usurpadora", além de uma melhor trilha sonora e um bom stock-shot (recurso de imagens gravadas)", afirma Alencar, para quem a teledramaturgia permite a integração latino-americana, a ponto de se converter em tema de sua futura tese de doutorado.
"A Televisa vem investindo muito em teledramaturgia para recuperar sua audiência, ameaçada com o surgimento, em 94, da rival TV Azteca", afirma Silvia Oroz, 47, professora de comunicação da UFRJ e da UNB.
Assessora de dramaturgia da Televisa, Oroz argumenta que a TV Azteca é mais comercial. "Ela já foi fundada com a missão de modernizar as produções mexicanas, não só de novelas, muitas delas exportadas para os EUA."
A professora conta que, na novela "Mirada de Mujer" (Olhar de Mulher), da TV Azteca, a protagonista é uma mulher na menopausa, que se apaixona por um homem mais jovem. A melhor amiga dela é uma mulher liberal que se relaciona com vários homens e acaba contraindo o vírus HIV.
"Isso significou uma renovação no universo da dramaturgia mexicana. Esses temas são de vanguarda, diferentes de "A Usurpadora", com a clássica troca de identidade das gêmeas Paola e Paulina, interpretadas pela atriz venezuelana Gabriela Spanic, e da mãe abnegada, desempenhada pela atriz e ex-cantora Libertad Lamarque (vovó Piedade)."
Para Oroz, ""A Usurpadora" é uma novela absolutamente tradicional, em termos de teledramaturgia e de contexto mexicanos".
"A emoção, característica fundamental das narrativas populares e da teledramaturgia, está presente em "A Usurpadora", um novelão exemplar, do qual gosto muito."
Oroz afirma que a Televisa tem uma linha de montagem nesse segmento de telenovelas. "Enquanto a TV Globo grava três novelas ao mesmo tempo, a Televisa roda seis." Cada capítulo da Globo custa entre R$ 80 mil e R$ 120 mil. Já na Televisa, esses valores caem para R$ 30 mil.

Bom negócio
O diretor comercial da DPZ, Daniel Barbará, 52, explicou que, em decorrência desse esquema industrial, as inserções publicitárias nas novelas mexicanas são entre 50% e 60% menores em relação às similares brasileiras.
Barbará avalia que os intervalos comerciais entre as novelas mexicanas são menores. "No SBT, isso ocorre exatamente para manter a audiência em alta e o espectador "preso" ao programa seguinte -no caso, o igualmente popular "Programa do Ratinho"-, garantindo fidelidade à emissora."
"Uma parte da elite brasileira não só assiste à novela mexicana e a programas populares como consome produtos anunciados nos intervalos dessa programação", adverte o publicitário Antonio Rosa Neto, 46. Ele diz que, com esse tipo de entretenimento, a população hoje entende melhor a TV. "O SBT está no caminho certo."

Fórmula eficaz
Para Herval Rossano, 64, diretor de núcleo da TV Globo, as novelas mexicanas mostram o que o público quer ver, a história da Cinderela, do forte contra o fraco. "É a fórmula que funciona".
Rossano diz que é preciso que a TV se dedique mais ao sonho e à ilusão do espectador.
Já Leonor Bassères, 73, roteirista da Globo, desmente a tese de que a telenovela está morrendo. "No Brasil, não é porque o SBT deixou de fazer novela e está importando que ela está em fase de extinção. Acho ótimo que se continue a fazer novela, onde quer que seja".
A roteirista reivindica a supremacia dos latino-americanos em novelas. "É um patrimônio nosso".
Pegando carona na onda mexicana, a atriz Arlete Sales diz que é preciso resgatar o folhetim.
"Quando assisto às novelas mexicanas me lembro de como tudo começou. É engraçado, nostálgico", afirma a atriz.
O diretor de programação do SBT, Eduardo Lafon, acredita que a exibição dublada de "A Usurpadora" não prejudica a audiência do horário. "A novela tem uma história leve e não identifica o México como cenário, o que poderia afastar o espectador".

Sinopse
A trama da "A Usurpadora" conta a história de Paulina (Gabriela Spanic), uma moça pobre que trabalha em um clube de luxo e mora com sua mãe, Paula (Nuria Bages), em uma choupana na cidade de Cancún. No trabalho, Paulina conhece uma sósia sua, Paola (Gabriela Spanic). Por uma oferta em dinheiro, Paola lhe oferece uma troca de identidade durante um ano, enquanto ela se diverte com seus amantes.
Pressionada pela sósia, Paulina acaba aceitando a proposta e vai para a mansão da família Bracho, onde Paola mora com seu marido, Carlos Daniel (Fernando Colunga) e os dois filhos dele do primeiro casamento, Carlinhos e Lisete. Na mesma casa mora a matriarca da família, a vovó Piedade. Junto com a usurpadora Paola, Piedade acaba tirando a família da ruína.
No SBT, "A Usurpadora" substituiu "Pérola Negra", novela que já foi produzida e exibida na Argentina e ganhou uma versão brasileira, adaptada por Crayton Sarzy, o homem que convenceu Silvio Santos a comprar da Televisa a trilogia "Maria Mercedes"/"Marimar"/ "Maria do Bairro", as novelas de maior audiência do SBT.
Vendida a 120 países e traduzida em mais de 25 idiomas, "A Usurpadora", alcança no Brasil índice semanal de audiência entre 19 e 21 pontos, segundo o Ibope. Cada ponto equivale a cerca de 80 mil telespectadores na Grande São Paulo.
É um ótimo índice, principalmente quando se compara com "Força de um Desejo", trama exibida às 18h pela Rede Globo e que, na semana passada, obteve médias de audiência entre 20 e 23 pontos. "Suave Veneno", a novela mais vista da TV, que vai ao ar às 20h40, também na Globo, atinge médias entre 35 e 38 pontos.


Texto Anterior: Multishow e Eurochannel estréiam seriados policiais
Próximo Texto: Elenco inclui uma ex-vedete argentina e estrela venezuelana
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.