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CRÍTICA
TV ignora mudança de Casoy
FERNANDO DE BARROS E SILVA
especial para a Folha
As Organizações Globo acusaram a sua preocupação com a
transferência de Boris Casoy do
SBT para a Record antes mesmo de
o jornalista estrear na nova emissora, na última segunda-feira.
Domingo passado, o caderno de
TV do jornal "O Globo", que tem
por costume noticiar o que se passa nos vários canais, não trazia
uma só linha a respeito de Casoy.
À primeira vista, a Globo não
tem com o que se preocupar. No
seu primeiro dia, o novo "Jornal
da Record", ancorado por Casoy,
oscilou entre sete e dois pontos de
audiência, contra uma média de 42
pontos do "Jornal Nacional". O
"TJ Brasil", do SBT, apresentado
por Hermano Henning, alcançou
dez pontos no seu pico.
Casoy mudou de emissora, mas
nada aconteceu. Até ele permanece o mesmo. Soltou logo no primeiro dia o "isso é uma vergonha!" -seu bordão característico.
Entre todos os apresentadores de
telejornais, ele é, apesar da sua baixa audiência, o que melhor traduz
o modo de ser e pensar da classe
média. É indignado, invariavelmente moralizante ou moralista,
quase sempre conservador.
A entrevista de estréia, com o
empresário Antônio Ermírio de
Moraes, veio corroborar essa imagem. Nas opiniões que emite, na
maneira com que se veste, na credulidade que manifesta a respeito
das pessoas e do país e até mesmo
no jeito meio ranzinza e birrento
de reclamar, Ermírio é a classe média encarnada, a despeito de estar
alguns tantinhos acima dela.
"Espero que seu programa represente para a Record o mesmo
que a Revolução Francesa significou para o mundo", disse no ar o
empresário, numa menção óbvia à
má imagem pública do dono da
emissora, o bispo Edir Macedo,
que Casoy teria por tarefa senão
apagar, ao menos amenizar. Nem
o âncora resistiu à comparação e
sorriu -cena rara.
De qualquer forma, o problema
maior de Casoy, ao que parece,
não é o bispo, mas a carência de
recursos técnicos e humanos do
seu telejornal. Visível no "TJ Brasil", a escassez de infra-estrutura
tornou-se ainda mais gritante na
Record. Nesse aspecto, ainda há
um abismo separando a Globo das
demais emissoras.
Mas o assim chamado "padrão
Globo de qualidade" tem como
contrapartida a pasteurização do
"Jornal Nacional", que, apesar
das reformas cosméticas por que
passou nos últimos tempos, continua engessado numa espécie de
burrice congênita que ao longo
dos anos foi se tornando consensual -algo como uma "voz oficiosa do Brasil".
É como se o "JN" condenasse todos os telespectadores a ter a mesma aparência robotizada de seus
apresentadores, que atuam à frente daquele cenário de inspiração
futurista como se estivessem impedidos de pensar.
Nesse sentido, Boris Casoy, Paulo Henrique Amorim na Bandeirantes e outros programas da TV
Cultura, como os telejornais, o
"Roda Viva" e o "Opinião Nacional", apesar de todos as suas carências e defeitos, acabam tendo
uma missão quase pedagógica na
televisão.
É verdade que esses programas
brigam por migalhas de audiência
e têm, por assim dizer, um efeito
apenas residual sobre a opinião
pública. Seria preciso que o país
fosse outro para que as coisas fossem diferentes. Feitas as contas,
está certíssima a bonita voz da vinheta, quando nos lembra feliz:
"quem tem Globo, tem tudo".
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