São Paulo, domingo, 20 de dezembro de 1998

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O contador de histórias

Fabiano Accorsi/Folha Imagem
Rodolfo Carlos e seu parceiro, o 'ET' Cláudio Chirinhan


DANIEL CASTRO
da Reportagem Local

A mentira é o segredo do sucesso do dublê de repórter Rodolfo Carlos de Almeida, 28, criador e parceiro do ET, personagem que Cláudio Chirinhan desempenha no "Domingo Legal", no SBT.
Mais do que campeões de audiência dos domingos do SBT, Rodolfo e ET cumprem a função de levantar o ibope do "Domingo Legal" (veja quadro na página ao lado). E podem ganhar um programa semanal no SBT, aos sábados, a partir de março. Isso se não forem contratados pela Rede Globo.
Rodolfo se intitula o criador do esquema de brigas forjadas dos programas de Ratinho. "Eu ensinei a produção a armar brigas."
Foi dele também a idéia de "fingir" que a dupla está tentando acordar Silvio Santos, um dos quadros líderes de audiência do "Domingo Legal", o programa que incomoda e frequentemente supera o "Domingão do Faustão".
Todos os domingos, desde fevereiro, quando foram contratados pelo SBT, Rodolfo e ET aparecem em frente a uma casa no Morumbi (zona sudoeste de São Paulo), que dizem ser a de Silvio Santos. Mas não é. A casa é alugada e fica a cerca de dois quilômetros da verdadeira residência do dono do SBT. Segundo Rodolfo, o SBT paga R$ 2.500 por sessão de gravações na fachada da casa.
As encenações do quadro "Acordando Silvio Santos", que continuam no ano que vem, ganharam um centro de custo próprio e orçamento de R$ 6.000 por programa, diz Rodolfo Carlos.
O faz-de-conta dá certo. No domingo 6 de dezembro, o quadro entrou no ar às 16h37 e levantou a audiência de 15 para 18 pontos. Em seguida, ET e Rodolfo "acordaram" o estilista Clodovil Hernandez. Deram pico de 25 pontos e média de 21. Cada ponto equivale a cerca de 80 mil telespectadores na Grande São Paulo.

Os tios

Foi inventando histórias para Ratinho, ainda no "190 Urgente!", na CNT/Gazeta, a partir de julho de 96, que Rodolfo Carlos começou a pavimentar o seu sucesso. Para tanto, o repórter (que nunca sentou no banco de uma faculdade e que começou a trabalhar em jornal aos 16 anos) contou com a ajuda de três tios: Raul Ribeiro de Almeida, 44, Hélio Ribeiro de Almeida, 37, e Isabel Ribeiro de Almeida, 33.
Raul era o seu cinegrafista; Hélio e Isabel, seus "atores". "Eu estava desempregado e o Rodolfo me chamou para gravar as histórias que ele criava. Eram as que mais davam ibope", lembra Raul.
Hélio fez apenas duas "interpretações" -uma para o "190 Urgente!" e outra para o "Ratinho Livre", na Record. Na CNT, fora seduzido pela "loira assombrada", que o levou para o cemitério e depois se trancou em um túmulo. Na Record, há um ano, brigou com a "amante" que dizia que ele tinha um caso com um travesti. "Nem casado eu sou", revela, hoje, Hélio.
Isabel atuou em duas histórias na CNT: uma era verdadeira (ela mostrava como dominara um ladrão que tentara lhe aplicar um golpe na fila de um banco); a outra era falsa: "A primeira briga que teve no "190' foi comigo."
Mas Isabel pegou gosto pela coisa e, "para ajudar Ratinho e Rodolfo", continuou participando de farsas. "Fiz uns oito casos diferentes. O último foi há quatro meses", admite. Para disfarçar, Isabel usava perucas e maquiagens diferentes a cada participação, que ela chama de "trabalhos".
Rodolfo tem uma explicação no mínimo criativa para as fraudes. "Eu reconstituía a verdade usando as pessoas, entre elas meus tios. A gente pegava a realidade e transformava em ficção. Histórias como a da loira assombrada existem. Eu mesmo entrevistei um cara que se masturbava com uma garrafa de Coca-Cola."

A fita

Há dois meses, quando a Folha revelou que as brigas exibidas pelo "Programa do Ratinho" eram forjadas, surgiram boatos de que Rodolfo estaria tentando extorquir o apresentador Carlos Massa em cerca de R$ 150 mil, em troca de uma fita supostamente bombástica.
De fato, a fita existe, e a Folha teve acesso a ela. A gravação, feita pela "tia Isabel" em vários dias de novembro de 97, mostra Ratinho em situação constrangedora, mas nada assim tão comprometedor.
Na fita, Ratinho aparece bebendo e comendo em um restaurante na Vila Madalena (zona sudoeste de São Paulo), ao lado de duas mulheres que horas antes brigaram em seu programa. A certa altura, Ratinho se refere a Isabel como "uma excelente artista", mas não há outros diálogos que liguem a fala ao fato de a tia de Rodolfo atuar nas armações.
Rodolfo nega a tentativa de extorsão. Diz que foi sua tia, Isabel quem tentou "pegar um dinheiro do Ratinho". Isabel também nega. "Meu marido sofreu um acidente e eu precisava de ajuda, mas nunca pedi dinheiro algum", afirma.
Hoje, Isabel se sente traída por Rodolfo e por Ratinho. "Agora que eles estão no auge não pensam mais na gente". Coincidentemente ou não, Rodolfo atualmente emprega seus tios Hélio e Raul, mas Isabel, não.



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