São Paulo, domingo, 21 de junho de 1998

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TV NO MUNDO
"Truman Show' discute o fascínio


ESTHER HAMBURGER
especial para a Folha, em Austin

"The Truman Show" acaba de entrar em cartaz nos EUA com estardalhaço. O filme, que traz um hilariante Jim Carrey no papel de estrela de uma novela -que vai ao ar todos os dias, 24 horas por dia, em transmissão direta, em tempo real e em canal de TV exclusivo-, é divertido e intrigante.
O filme discute o fascínio do público pela intimidade alheia, ao mesmo tempo em que nota a torcida do mesmo público para que o personagem consiga se livrar do jugo das câmeras.
Uma referência clara aqui é a morte da princesa Diana e a reflexão sobre os limites da intrusão das câmeras que ela provocou.
O sucesso da novela dentro do filme se deve ao fato de que Truman (Jim Carrey), o personagem principal, não sabe que sua vida está sendo registrada minuto a minuto, a partir dos mais variados ângulos, por 5.000 câmeras disfarçadas, cujas imagens são transmitidas pela televisão para uma audiência fiel e consumidora de produtos relacionados à marca do programa.
A ignorância do personagem supostamente garante a autenticidade de seu comportamento. Mas também o faz prisioneiro. Truman não pode sair do alcance das luzes. Ele é cativo do estúdio. Vive em uma ilha-cenário inventada e isolada. Seus amigos e parentes são atores contratados. Seu cotidiano consiste em contracenar involuntariamente.
O que torna "The Truman Show" um bom filme é a reflexão sobre o embaralhamento de diversos níveis de realidade, o da pessoa-personagem, o dos amigos-profissionais, o do criador do programa, o dos fãs em casa assistindo e consumindo, o da platéia no cinema. E o de Jim Carrey, que anuncia logo no início que está fazendo um filme sobre si mesmo.
À primeira vista, "The Truman Show" é mais uma história a la "Admirável Mundo Novo" ou "1984", fábulas sobre a falta de liberdade e a pasteurização do mundo tecnologizado e impessoal deste final de século. Mas essa impressão de que a narrativa vai simplesmente reproduzir os surrados presságios do fatalismo futurista, da falta de subjetividade, do controle quase remoto da maioria dos seres pelos poucos que possuem acesso à inteligência e aos recursos do espetáculo, como que se desvanece no decorrer do percurso. Ao final, a torcida é para que Truman consiga se libertar dos holofotes.
"The Truman Show" representa a primeira incursão do prestigiado Peter Weir pelo terreno do cinema comercial. O resultado combina a densidade do diretor australiano com o humor escancarado, a la Jerry Lewis, de Jim Carrey, em um filme ao mesmo tempo horripilante e leve, como convém a um lançamento de férias.


E-mail: ehamb@uol.com.br



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