|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TV NO MUNDO
"Murphy Brown' sai por baixo
ESTHER HAMBURGER
especial para a Folha, de Austin
Os tempos são de auto-exame. Depois da catarse
provocada pelo final auto-reflexivo de "Seinfeld", "Murphy Brown",
comédia estrelada por
Candice Bergen, que, em
1992, causou a ira do vice-presidente republicano,
também encerrou atividades com auto-reflexão.
"Seinfeld" saiu em alta.
"Murphy Brown" saiu
derrotada pelo frescor
contemporâneo de "Ally
McBeal", que vai ao ar no
mesmo horário na Fox.
Ambos tomam parte do
olhar autocrítico que parece ter se abatido sobre a televisão americana desde
que os paparazzi foram
acusados de se omitir de
tentar socorrer a princesa
Diana.
Enquanto o "show sobre
nada" causou frisson porque recusou o contrato
milionário, "Murphy
Brown" se despediu em
baixa. O último episódio
foi chato e teve poucos
bons momentos.
"Murphy Brown" encarnou o ideal de mulher
feminista e politicamente
correta do final dos anos
80. Irreverente, executiva e
bem-sucedida, teve seu
momento de glória quando engravidou e resolveu
ter um filho sozinha, legitimando o modelo da mãe
solteira no horário nobre
da CBS.
O episódio envolveu polêmica entre a segunda autoridade pública da maior
potência do planeta e uma
personagem de ficção televisiva devidamente representada pela atriz que a encarnava.
O bate-boca, entre o político eleito e a figura meio
virtual, na época ocupou
as primeiras páginas dos
jornais e gerou campanha
de solidariedade na convenção republicana.
Murphy teve o filho, mas
ele não apareceu muito na
história, que voltou ao seu
curso anterior e foi perdendo a força.
O tema da última estação, o câncer de mama, fez
a personagem aparecer
mais como uma resignada
assistente social fazendo
um programa de saúde
preventiva do que como a
jornalista que um dia saltou do domínio da ficção
para o centro da cena política norte-americana.
"Ally McBeal" está
muito mais conectada com
as ansiedades do momento. A executiva não precisa
mais demonstrar do que é
capaz na profissão pública.
Como que recuperando
uma dimensão perdida,
para arrepio de feministas,
o desafio está em se realizar no casamento.
No final de "Murphy
Brown", Jim, o âncora do
telejornal fictício, reconhece que perdeu a graça.
O show saiu de sintonia. E
televisão é assim. Mas televisão é também indiscrição e voyeurismo.
"Seinfeld" tematizou a
banalidade de pequenas
infrações cometidas por
heróis sem caráter, transformadas em assunto de
grande relevância pelo
olhar indiscreto das câmeras.
E-mail: ehamb@uol.com.br
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|