São Paulo, domingo, 28 de janeiro de 2001

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EM BUSCA DE IBOPE

Pagodeiro comanda auditório em atração que estréia em março na Record; artista ainda tenta emplacar sitcom sobre comunidade negra

Netinho lança programa e debate racial

Ed Viggiani/Folha Imagem
O pagodeiro Netinho, que estréia programa de auditório em março


Líder do Negritude Jr., que pode entrar na guerra de audiência, questiona a dificuldade de conseguir espaço para retratar o cotidiano de uma família negra brasileira na televisão

LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

NEGRO, pagodeiro, nascido e criado na periferia, Netinho pode ser o mais novo personagem da acirrada guerra por audiência dos domingos na TV. O líder do grupo Negritude Jr. assinou contrato com a Record, semana retrasada, para apresentar um programa de auditório na emissora, que há muito tempo planeja entrar na briga contra SBT e Globo.
Netinho se empolga com o desafio, mas não esconde a decepção por mais uma vez ter tido de adiar seu maior projeto para a TV: uma sitcom que retrate o cotidiano de uma família negra brasileira. A atração é planejada por ele há dois anos e já chegou a ser negociada com a Rede TV!, mas acabou não indo ao ar.
Quando foi chamado pela Record, o músico achou que finalmente iria colocar a questão racial em foco na TV. Mas a emissora decidiu engavetar a sitcom e investir em um programa de auditório. Para Netinho, a Record tem o mérito de colocar um negro no comando de uma atração importante, mas ainda tem "um medo muito grande" de ter um produto que discuta diretamente questões raciais. "O fato de um negro apresentar um programa em uma das principais emissoras do país já é um bom começo e deve ser orgulho para a nossa comunidade. Mas não vou abandonar a sitcom e tentarei negociá-la com outras emissoras", diz.
O ator Norton Nascimento também já tentou emplacar um programa com um núcleo negro protagonista. Em 1997, o ator chegou a gravar um piloto (programa-teste) de um "talk show" comandado por ele, com a equipe formada por negros. Mas nem a Globo, da qual era contratado desde essa época, nem outras emissoras quiseram colocar a atração no ar. "A TV brasileira precisa de um programa que ponha a comunidade negra com auto-estima. Isso não significa mostrar um negro de terno, mas mudar o modo de tratar a história dos negros."
Nos Estados Unidos, sitcoms sobre famílias negras são sucesso de audiência. Como aconteceu no mercado editorial brasileiro, com a revista "Raça", os produtos tiveram apoio de anunciantes interessados no potencial de consumo da população negra. Alguns desses seriados acabam sendo exibidos na TV paga.
Mas a televisão aberta não se mostra, pelo menos por enquanto, disposta a investir nessa linha. A direção da Record afirmou que o projeto da sitcom de Netinho não está completamente abandonado, mas acha cedo para colocar a questão racial como foco principal de um programa. Para os diretores, a emissora não pode optar por um segmento específico no Ibope e pretende continuar trabalhando com a idéia de audiência de massa.
Luís Erlanger, diretor da Central Globo de Comunicação, disse que Norton Nascimento acaba de ter um papel de destaque em "Aquarela do Brasil" e é respeitado na emissora. Sobre o projeto do ator, afirmou que "assim como ele, muitos encaminham projetos e o critério de avaliação não se baseia na cor". Disse que "a entidade que representa os artistas negros recentemente divulgou carta reconhecendo o empenho da Globo em mudar as distorções no uso do elenco, que infelizmente reproduzem um problema maior da nossa sociedade".
Há raros casos na TV de negros no comando de atrações, como "Show em Si...monal" (Record), apresentado Wilson Simonal nos anos 60, e "Na Geral" (Band), de Robson Caetano, em 1999.



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