São Paulo, domingo, 11 de agosto de 2002

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SAIBA O QUE ELES PENSAM SOBRE A CRISE

Perguntas

As vendas de carros caíram 20% em relação ao ano passado. Os pátios das principais montadoras nacionais estão lotados. Na sua avaliação, o que levou a esse estado de coisas?

Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
São duas as principais causas. Por um lado, a indústria automobilística brasileira está superdimensionada. Sua capacidade de produção é de 3,2 milhões de veículos por ano, enquanto nossa capacidade de consumo não chega à metade disso. Por outro lado, o baixo crescimento da economia e a redução do poder de consumo têm reduzido a compra de veículos

Ciro Gomes (PPS)
Há um excesso de capacidade ociosa no setor automobilístico não só no Brasil, mas no mundo todo. Por aqui, imaginou-se que o boom de crescimento pós-Plano Real iria se manter para sempre, mas, de 1998 para cá, a situação se inverteu. O Brasil e o Mercosul entraram em crise devido às deficiências do modelo econômico adotado, baseado na dependência de capitais externos e especulativos em detrimento da produção e da poupança internas

José Serra (PSDB)
Não são apenas o nível de renda ou dos salários ou as facilidades oferecidas pelos revendedores, como baixas taxas de juros, mas a confiança do consumidor em relação à estabilidade econômica do país. Ele quer segurança em relação às suas próprias possibilidades para assumir compromissos futuros ou para desembolsar recursos de poupança para a aquisição de um veículo

Se eleito e caso problema similar ocorra no seu governo, o que o sr. fará?

Pretendo imprimir um ritmo de crescimento mais acelerado da economia, o que implicará a ampliação do mercado interno e aumento da capacidade de consumo. É preciso criar as condições para que a indústria automobilística exporte os produtos excedentes. Combinando o programa de renovação da frota com um programa de exportação mais eficaz, seremos capazes de absorver toda essa capacidade produtiva que foi gerada no setor automobilístico. Também seria preciso apressar a redução da taxa de juros, baratear os financiamentos e injetar algum ânimo na economia brasileira

Para evitar esse estado de coisas é preciso mudar o modelo econômico. Diminuir a dependência do capital externo e fomentar a geração e a ampliação da poupança interna para financiar o desenvolvimento econômico brasileiro

A retomada desse mercado é especialmente importante, pois o setor automotivo representa cerca de 10% do PIB da indústria. Por seus efeitos sobre a demanda de autopeças e insumos e sobre um imenso mercado de serviços pós-venda, o desempenho das montadoras apresenta um forte impacto sobre o nível de atividade da economia

O sr. conhece a proposta de renovação da frota de veículos em circulação no país, entregue pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC ao governo há dois anos? Se sim, o que acha dela? Se houver política de renovação da frota no seu governo, como funcionará e quem arcará com as despesas?

Esse projeto tem muitas vantagens. Permitiria substituir um grande conjunto de veículos já ultrapassados, que não oferecem seguranças, causam acidentes e poluem o ar. A renovação de frota permitiria aos trabalhadores de menor poder aquisitivo ter acesso a carros de melhor qualidade. Para a sua viabilização, seria preciso que o governo proporcionasse financiamento a baixo custo e pagasse uma determinada quantia para a entrega do carro velho

A política de renovação de frota somente sairá do papel se conseguirmos efetuar uma profunda reforma tributária, uma das minhas prioridades. Logo, da parte que cabe ao governo, se aprovada a reforma tributária nos moldes que propomos, a renovação da frota será enfim viabilizada

Sim. Vamos discutir propostas como essa, principalmente se compreender veículos que usem combustíveis limpos. A implantação de uma política de renovação de frota requerer uma divisão equilibrada dos custos entre o governo e os diversos agentes da cadeia automotiva

Que avaliação o sr. faz da tributação sobre os veículos produzidos no Brasil? E sobre os importados?

De modo geral, a tributação sobre os veículos produzidos no Brasil é adequada. Talvez no caso dos veículos "populares" seja possível pensar em uma tributação menor, de modo a facilitar sua venda e negociação. Sobre os veículos importados, deve-se manter uma tributação mais elevada, de modo a estimular o consumo dos carros produzidos no Brasil

O nosso modelo tributário prevê transferir da produção e dos salários para o consumo e os ganhos de capital a base de incidência do ônus fiscal. Sobre os veículos produzidos no país recairão apenas dois impostos: o Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) e o Imposto Seletivo sobre o Consumo (ISC), este último somente sobre os carros de luxo. Já o imposto de importação é um instrumento de política industrial que continuará sendo utilizado

Reconheço que a carga atual é elevada. Ela poderá ser revista no âmbito da reforma tributária, prioridade do meu governo. Em relação aos produtos importados, mais importante que a alíquota atual é a trajetória de redução: em 1990, era de 85%

Nos anos 90, o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) era de 0,1% para veículos "populares". Sua proposta de governo prevê alguma medida desse tipo para aquecer o setor?

Não respondeu

No nosso modelo tributário não existirá mais o IPI

Os veículos produzidos no Brasil atualmente são modernos e competitivos no mercado internacional. A reforma tributária, com forte viés pró-exportação, e as medidas que vamos adotar para incentivar as vendas externas vão permitir a recuperação da produção e das vendas do setor automotivo

Como o sr. avalia as atuais alíquotas de importação? Quem tem fábrica no Brasil deve pagar menos?

Não respondeu

Isso será definido no bojo de uma política industrial. Mas é importante salientar que todo estímulo, seja ele tarifário, tributário ou creditício, terá caráter temporário e decrescente

Considero a alíquota de 35% adequada. Não vejo por que diferenciar alíquotas do imposto de importação para montadoras instaladas no país já que não estão mais vigentes os compromissos de exportação e de nacionalização

No caso das compras de automóveis a prazo, qual deve ser a política das taxas de juros?

Não cabe ao governo determinar quais serão as taxas de juros a serem praticadas no financiamento de veículos a prazo. Cabe ao governo criar as condições para uma redução expressiva dos juros básicos brasileiros, de modo que todo financiamento ou consumo tenha juros mais civilizados, e a população de baixa renda possa ter acesso a esses produtos

Quem define a taxa de juros é o mercado. Cabe ao governo apenas construir um ambiente macroeconômico saudável e com taxas de juros civilizadas. Para isso iremos combater em todas as frentes o enorme déficit em conta corrente do país e, adicionalmente, encaminhar ao Congresso as nossas propostas tributárias e previdenciárias

As montadoras possuem seu braço financeiro, o que permite que ofereçam financiamento com as mais baixas taxas de juros praticadas para o crédito ao consumidor. Assim, entendo que não há necessidade de uma política específica de juros para o setor

Na sua opinião, há excesso de montadoras no Brasil?

Não respondeu

O problema não é tanto o excesso de montadoras, e sim o fato de que o mercado consumidor, pela deficiência do modelo econômico que foi implantado no país nesses últimos oito anos, não cresce

Não. Entendo que o regime automotivo foi extremamente eficiente na atração de novos investimentos para o setor. Há ainda um enorme potencial de crescimento da demanda, além das oportunidades para o aumento das exportações

Que medidas as próprias montadoras poderiam tomar para desovar seus estoques?

Não respondeu

Em qualquer mercado competitivo, quando há excesso de oferta, o preço cai

Elas devem ampliar as exportações. No curto prazo, deverão manter suas estratégias de comercialização, com promoções agressivas, acopladas a condições adequadas de financiamento



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