São Paulo, domingo, 16 de março de 2008

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CAPITÃES DA INDÚSTRIA

JÉRÔME STOLL


Erramos ao lançar primeiro o Mégane com motor 1.6

Para reforçar imagem de luxo, sedã terá opção mais equipada em 2 meses

De seu escritório na Vila Olímpia (zona oeste de São Paulo), o presidente da Renault do Brasil, Jérôme Stoll, vê o movimento dos aviões que partem de Congonhas e voltam para lá. É um balanço inspirador para chefiar uma montadora que jamais dera lucro. Mas, em 2007, esse tunisiano tirou a empresa do vermelho. Transferiu a produção do Clio para uma ociosa fábrica na Argentina para abrir espaço na também ociosa fábrica no Paraná para fazer o Logan. (JOSÉ AUGUSTO AMORIM)

Não foi um processo fácil.
Em 2006, quando assumiu o posto, Stoll, 54, anunciou o plano Contrato Mercosul 2009: o Mégane Sedan, a Mégane Grand Tour, o Logan, o Sandero e mais dois carros a serem feitos na região teriam a missão de dobrar as vendas da francesa, que fechou 2007 com 3,14% de participação de mercado.
Foi preciso trabalhar até com recursos humanos para estimular os funcionários. A tática parece ter dado certo. Em setembro, o mundo se surpreendeu com o Sandero, que não era um Logan "cortado". O segredo foi tão bem guardado que nenhuma foto sua vazou.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista, em que Stoll defende as duplas Clio-Sandero e Scénic-Grand Scénic.

 

FOLHA - Qual a importância do Brasil para o grupo Renault?
JÉRÔME STOLL
- O volume das vendas é um dos maiores do mundo, e seu crescimento é também um dos maiores. A nossa participação [de mercado] é baixa porque ainda não desenvolvemos completamente as linhas de produtos que são focadas no nosso mercado. O Brasil é o nono mercado da Renault, mas pode crescer mais.

FOLHA - A criação do Sandero dá mais importância para o país?
STOLL
- A decisão de desenvolver esse carro foi feita com a perspectiva das vendas no Brasil. Todos os engenheiros pensaram no Brasil, nas vendas do Brasil, no consumidor brasileiro. Ele também é bonito, então outras regiões vão vendê-lo.

FOLHA - Em 2008 haverá um produto criado no Brasil?
STOLL
- O plano Contrato 2009 previu seis novos produtos. Quatro já estão no mercado; outros devem chegar em 2010.

FOLHA - Como o Brasil está cumprindo sua parte no Contrato 2009?
STOLL
- O Contrato 2009 teve três objetivos: dobrar o volume das vendas da Renault do Brasil até 2009, ficar entre os três primeiros em qualidade de produtos e de serviços e ter lucro. A Renault do Brasil teve prejuízo desde o início da atividade.

FOLHA - A fábrica ainda é ociosa?
STOLL
- No início do plano, o nível de ociosidade era de 65%. Agora é de 40% a 45%.

FOLHA - Ainda é uma ociosidade bem grande.
STOLL
- É grande, claro. Você fala sobre ociosidade, você fala sobre potencial de crescimento. É um potencial importante para crescer, pois, com os investimentos que o grupo pode fazer no mundo, é uma batalha atrair a decisão para o nosso mercado. A fábrica já existe.

FOLHA - Com tamanha ociosidade, por que transferir a produção do Clio para a Argentina?
STOLL
- Concentrar a fabricação de um modelo numa fábrica é sempre melhor para a rentabilidade. Decidimos focar toda a produção do Clio na Argentina e a da plataforma do Logan no Brasil. A segunda razão é que a Argentina é um país mais e mais competitivo, com o peso desvalorizado.

FOLHA - O que a Argentina produz?
STOLL
- O Clio, a Kangoo e o Mégane anterior, que realmente tem um grande sucesso no mercado argentino. Pode ser uma nova estratégia para a Renault, uma montadora um pouco nova na região. Outras, como a Fiat e a Volkswagen, vendem durante um período longo o mesmo carro com algumas modificações. Se o cliente tem interesse porque o preço é baixo, é interessante para a montadora continuar com a produção.

FOLHA - O Clio e o Logan vão conviver enquanto o mercado aceitar?
STOLL
- Fazemos negócios. Se temos lucros com ele, seria um crime parar a produção.

FOLHA - Gostaria que o sr. comentasse os três pontos do Contrato 2009. A Renault já deu lucro?
STOLL
- Sim. Em 2007, atingimos o "break even point" [equilíbrio entre receitas e despesas]. Tivemos lucro, e não pouco prejuízo [risos].

FOLHA - Em cinco meses, o Logan teve dois recalls. Como a Renault vai atingir a meta de qualidade?
STOLL
- O recall é uma política do grupo. Desde o momento em que conhecemos [o problema], decidimos fazer um recall. É uma proteção para o cliente e, no longo prazo, uma política de confiança. O consumidor sabe que não precisa se preocupar: "Eles farão um recall se um problema de qualidade existir".

FOLHA - Em relação ao volume, o problema é falta de produto, de concessionária, de interesse do consumidor pela marca Renault?
STOLL
- A notoriedade de marca é ainda um pouco baixa. A imagem é boa, mas as pessoas não conhecem [a marca]. Os brasileiros conhecem a Renault, mas não sabem que ela fabrica carro no Brasil. Com a introdução de produtos como o Logan e o Sandero, a familiaridade cresce dia a dia. O volume de vendas do Logan já é maior do que nossa expectativa. Com um pouco mais de tempo e com os produtos que estamos lançando, a maneira de considerar a Renault na lista de compras cresce.

FOLHA - O Logan poderia vender mais do que vende hoje?
STOLL
- Claro. Uma expressão que Carlos Ghosn [presidente mundial da Renault] já usou é que um brasileiro a cada dois não conhece a Renault. Se trabalhamos com a familiaridade da marca e a fazemos parte da lista de compras, a participação cresce. Quando o consumidor visita nossa loja e faz um test-drive, ele compra.

FOLHA - Por que o Mégane não conseguiu bater os concorrentes?
STOLL
- Cometemos um erro ao lançar esse produto só com motor 1.6. Devíamos ter lançado o 2.0 antes. Agora trabalhamos para consertar esse erro. Vamos lançar uma versão mais alta, em dois meses, para fortalecer a imagem do Mégane. São Paulo é um mercado para o 2.0 com caixa automática.

FOLHA - A nova versão vai trazer quais equipamento a mais?
STOLL
- Mais. Mais [risos].

FOLHA - Quanto vai custar?
STOLL
- Só é mais luxo.

FOLHA - Se a idéia é reforçar o luxo, por que a Renault lançou a Expression, uma versão mais simples?
STOLL
- O mercado brasileiro é diferente no Norte, em São Paulo, no Sul. Essa estratégia funciona bem no Sul, mas não funciona em São Paulo. Devemos trabalhar sobre o mercado de São Paulo, que é muito importante para esse segmento.

FOLHA - A Renault vai continuar vendo as vendas da Scénic despencarem sem reagir?
STOLL
- Ainda temos consumidores para comprar essa Scénic, e ela vai continuar. Para quem quer novos carros, vamos oferecer a Grand Scénic.

FOLHA - Qual o objetivo de trazer o Mégane Cabriolet, um carro que venderá tão pouco?
STOLL
- Sonho. O objetivo é fortalecer a imagem da marca, atrair o consumidor à loja, mostrar que a Renault pode fabricar todos os tipos de veículo, incluindo os que são de sonho.

FOLHA - Haverá um novo produto da família do Logan em 2008?
STOLL
- Em 2008, pode ser; em 2009, não; em 2010, pode ser.

FOLHA - Isso inclui a picape?
STOLL
- Pode ser picape, pode ser outro sedã. Trabalhamos com carros que não existem e que podem ser criados aqui.


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