São Paulo, sábado, 12 de abril de 2008

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BAGAGEM [compras mundo afora]

Olá, Lênin

Em Moscou, turistas consomem badulaques do regime comunista

IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA


O protagonista do genial "Adeus, Lênin" passa o filme todo se esforçando em remontar um microcosmo comunista no quarto da mãe adoentada, que estava em coma quando o Muro de Berlim caiu e não suportaria a nova realidade. Para tanto, o jovem busca em lixeiras todo o tipo de tranqueira do governo que batera as botas. Se o personagem do filme de 2003 vivesse na Moscou de 2008, sua vida seria muito mais fácil.
O regime fundado por Lênin acabou há 17 anos, mas o comércio de badulaques comunistas segue a todo vapor, mais por obra de um certo culto ao kitsch soviético do que por uma nostalgia real -quem tem saudade da URSS vota nos comunistas, não vai às compras.
A lista começa por pequenas estátuas de ferro do velho Vladimir, encontráveis nas banquinhas da rua Arbat, no centro moscovita. Um exemplar pequeno sai por R$ 20, a depender do seu poder de barganha com as senhoras idosas que disputam os turistas a rosnados.
As passagens subterrâneas sob as grandes avenidas, como a Tverskaia, são ótimos lugares para encontrar toda sorte de vestimenta militar -de quepes a capacetes do Exército Vermelho, que custam entre R$ 40 e R$ 100, dependendo do estado de conservação. Outro hit são as camisas listradas de marinheiro, a R$ 17 o modelo de mangas longas, mas elas podem ser associadas tanto à nostalgia kitsch quanto ao consumo fetichista gay -algo meio "Querelle", digamos assim.
As feiras ao ar livre, que vendem absolutamente de tudo, são bons pontos para garimpar lembrancinhas. Uma dessas mecas é a Ismailovski, no parque e estação de metrô homônimos. Lá, todo tipo de pin (R$ 2 para broche com navio da Frota Vermelha), telefone anos 50 (R$ 100) e até velas com a efígie de Josef Stalin (R$ 10).

Gordura histórica
Mas nem tudo é tão barato. Mais na linha "soviet chic", há lugares como a Gastronom nº 1, uma loja para gourmets que dedica boa parte de suas prateleiras à antiga mania soviética de enlatar tudo. Com visual retrô, ainda que não de forma proposital, latinhas com carne de boi, de frango, de vaca e de peixe dividem espaço com azeites italianos e azeitonas gregas, trufas e outros itens bacanas.
As latinhas saem por cerca de R$ 10 cada uma, duas vezes mais que nos mercadinhos de esquina, espalhados pela capital russa. Mas é uma experiência soviética, no registro mais preconceituoso: a carne de vaca, por exemplo, é conservada numa gordura que parece estar lá desde que Kruschov dava as ordens no Kremlin. Em compensação, os sucos em grandes vidros de três litros são tão artificiais quanto deliciosos. Saem por cerca de R$ 9 na Gastronom e metade disso na rua.


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