Fanfarrão, Gary Shteyngart fala sobre o fracasso da literatura e o fascínio pelo Brasil
Quaisquer dois dedos de prosa com o escritor Gary Shteyngart, 40, descambam tão logo para a comédia, que não é difícil o interlocutor se sentir numa esquete de sitcom.
Em tudo há humor ferino, sagaz e auto-depreciativo. Nos seus livros, que ele lançará neste domingo (8), na Flip, onde divide mesa (Entre Fronteiras) com o inglês Hanif Kureishi, idem.
Nascido em Leningrado, na Rússia, Shteyngart vive desde os 7 anos nos Estados Unidos. Tanto tempo apagou qualquer sentimento de exílio, como ocorria aos seus pais.
"Ainda mais vivendo em Nova York, que é basicamente uma cidade de forasteiros", disse ele em entrevista à Folha, pouco antes de chegar em Paraty.
Autor do aclamado "Absurdistão", lançado no Brasil em 2008, em que retrata pela ótica de um playboy russo mimado e arbitrário parte dos desmandos em seu país de origem ("sempre governado por uma elite pequena e corrupta"), o escritor se tornou uma figura pop.
Colabora com o jornal "The New York Times" e com a revista "New Yorker", além de dar aulas de escrita criativa. Entre os seus alunos, o ator James Franco é de longe o mais estrelado -- "o melhor de todos, juro!".
Seu romance mais recente, "Uma História de Amor Real e Supertriste", mantém as linhas que o consagraram: distorcer quase ao pastiche qualquer situação, para criticá-la impiedosamente.
Ele já o fez com a política, a xenofobia, o capitalismo e, agora, com uma relação de amor fadada ao fracasso. Tema, aliás, que lhe interessa sobremaneira.
"É uma decepção que depois de três livros eu não tenha me tornado um completo fracasso. Ao mesmo tempo, garante que eu tenha sempre algo para falar com o meu psiquiatra", diz ele, que mantém sessões semanais com o especialista.
Para Shteyngart, fracasso notável é o interesse decrescente pela leitura. "Vivemos a era do visual, em que o interesse pela imagem sobrepõe a leitura. Quer dizer, um declínio claro da civilização".
Uma saída, quem sabe, seria a junção de todos esses elementos. Foi o que ele fez, quando convidou os amigos famosos, como James Franco e o ator Paul Giamatti, para protagonizarem trailers dos seus livros.
"Se você não fizer isso hoje em dia, as pessoas nem vão saber que você lançou um livro, né?", provoca ele com humor que já houve quem comparasse ao de Nicolai Gogol, clássico autor russo.
Ao passo que lança mão de recursos como os "booktrailers", Shteyngart se diz um inábil com novas tecnologias de leitura. "Cara, eu mal consigo usar uma calculadora. Um [e-reader] kindle, então, é assustador", conta.
Quando cessam os assuntos referentes à literatura, o escritor se põe a falar sobre o Brasil, onde esteve em 2006 em um périplo longo, pelas regiões Sudeste e Nordeste.
"Foi uma viagem maravilhosa. Conheci uma capivara muito, muito simpática em São Paulo, conversei bastante sobre bundas no Rio de Janeiro e te digo: não há nenhum lugar no mundo como a Bahia. Se eu dançasse um pouquinho melhor, já estaria morando lá".
Fica a dica para convites. Também para autores brasileiros, que Shteyngart diz não conhecer nenhum. "Quero conhecê-los. Vou usar um crachá gigante pedindo que se apresentem. Acho que vai ajudar".
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