Crítica: Escritor Dennis Lehane une violência e rigor histórico em novo livro
Desde menino, o sonho de Dennis Lehane era escrever um romance de gângsteres. Algo memorável, na linha de "Scarface", de Armitage Trail, ou "O Poderoso Chefão", de Mario Puzo.
Lehane tornou-se mundialmente conhecido graças à adaptação para as telas dos romances "Sobre Meninos e Lobos" (2001), e "Paciente 67" (2003). Clint Eastwood dirigiu o primeiro longa (de longe o melhor dos dois) e Martin Scorsese, o segundo, batizado no país de "Ilha do Medo".
O problema com essas adaptações, bem menos interessantes que os livros, é que Lehane é um ficcionista cadenciado e meticuloso, que dedica dezenas de páginas até a situações e personagens secundários, sem pressa.
Ana Ottoni/Folhapress | ||
O escritor americano Dennis Lehane durante entrevista à Folha em Paraty, em 2007 |
Em duas horas e meia de projeção não daria para condensar enredos tão amplos sem sacrificar a qualidade ou fugir da matriz literária.
Desafio maior para o cinema é certamente "Os Filhos da Noite", romance mais recente do autor.
A narrativa de 480 páginas, cujos direitos Ben Affleck já tratou de adquirir, cobre um período de tempo não muito extenso -pouco menos de uma década- na vida do fora da lei Joe Coughlin. Mas, nesses quase dez anos, de 1926 a 1935, acontece o diabo.
No início do livro, vemos o jovem Joe e seus melhores amigos assaltando um bar clandestino no sul de Boston. Estamos em plena Lei Seca.
Começa aqui a ascensão de um futuro mafioso. Em pouco tempo, Joe subirá muitos degraus no organograma do crime organizado. Dois itens seguem o herói em sua jornada: um objeto e uma certeza.
O objeto é um relógio de ouro recebido de presente de seu pai, destacado capitão de polícia -ou seja, um cidadão corrupto como qualquer outro. A certeza é a frase sempre repetida: "Eu não sou um gângster, sou um fora da lei", na tentativa de negar para si mesmo sua real identidade.
Joe detesta resolver tudo à bala ou na porrada, preferindo as soluções diplomáticas, mas a especialidade de Lehane é mesmo a violência.
Os melhores momentos de "Os Filhos da Noite" são os mais brutais: o assalto ao banco First National, a temporada na Penitenciária de Charlestown, o roubo de armamento da Marinha norte-americana, a guerra contra a Ku Klux Klan e o combate final contra o chefão Maso Pescatore e seus homens.
Sustentando cada situação, por mais macabra que seja, há uma cuidadosa rede de dados, fruto de uma pesquisa histórica consistente.
"Os Filhos da Noite" recebeu críticas positivas e negativas nos Estados Unidos. Essa recepção polarizada talvez o deixe de fora do ranking dos melhores romances de gângsteres, mas não resta dúvida de que é um dos melhores livros de Dennis Lehane.
LUIZ BRAS é autor de "Sozinho no Deserto Extremo" (Prumo).
OS FILHOS DA NOITE
AUTOR Dennis Lehane
TRADUÇÃO Fernanda Abreu
EDITORA Companhia das Letras
QUANTO R$ 49,50 (480 págs.)
AVALIAÇÃO bom
Livraria da Folha
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