Crítica: Trunfo narrativo, filme histórico é espantosamente rico e nuançado
"Selma", o novo e audacioso de Ava DuVernay, retrata eventos importantes da história do movimento dos direitos civis nos EUA. Para contar devidamente essa história, um diretor consciencioso traçaria um percurso desde pelo menos em 1619, quando os primeiros africanos escravizados chegaram, até os dias de hoje.
Estreitar o escopo –"Selma" abre com o discurso de King ao receber o Nobel da Paz em 1964, e acaba em Montgomery cerca de três meses mais tarde– cria outros desafios.
Como capturar o caos, a incerteza e a imensa onda de fatos sem sacrificar a coerência? Como conferir a um episódio histórico relativamente conhecido do passado recente a urgência do tempo presente?
As respostas estão todas lá na tela. Mesmo que você imagine que sabe o que vai acontecer, "Selma" cintila com suspense e surpresas. Cheio de incidentes e de personagens fascinantes, o filme é um triunfo da narrativa cinematográfica eficiente e enfática.
King, vivido por David Oyelowo com a graça e dignidade requeridas, mas também com traços de humor, cansaço e dúvida, ocupa posição central em "Selma". Mas o filme prefere compreender suas fontes e limitações, restaurar suas dimensões humanas, do que afirmar a grandeza da figura.
O retrato feito por Ava DuVernay é espantosamente rico e nuançado. Raramente vi um filme histórico que parecesse tão populoso e cheio de vida, tão alerta aos ramos da narrativa que se espalham para além do quadro.
"Selma" não é um manifesto, um grito de guerra ou uma lição de História. É um filme: caloroso, inteligente, generoso e comovente. Causará lágrimas de pesar, raiva, gratidão e esperança. E como manifestantes que acompanharam King, o filme não faz paradas para repouso.
SELMA
DIREÇÃO Ava DuVernay
ELENCO David Oyelowo, Martin Sheen, Tim Roth, Oprah Winfrey
PRODUÇÃO Reino Unido/EUA, 2014
ESTREIA sem previsão no Brasil
Tradução de PAULO MIGLIACCI
Livraria da Folha
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