Livro de Edyr Augusto oferece narrativa assustadora com discurso enxuto
O esquisito nome do livro, "Pssica", de Edyr Augusto, talvez mais afaste que aproxime; o começo da leitura impõe outro estranhamento, com suas frases simples, nunca com mais de dez palavras, empilhando fatos sobre fatos, sem dar notícia de qualquer subjetividade dos personagens. No entanto, trata-se de um experimento de valor no panorama brasileiro atual.
No centro do enredo está Janalice, adolescente de Belém do Pará; o tempo é agora; o narrador, externo ao enredo, alia a vocação para a crueza com um grande conhecimento empírico do mundo paralelo em que habitam traficantes de drogas e de pessoas, bandidos de toda ordem e toda a gente miserável.
Danilo Verpa/Folhapress | ||
SAO PAULO - SP - 17.08.2015 - Retrato do escritor paraense Edyr Augusto, na Livraria da Vila, que lanca agora o romance "Pssica". . (Foto: Danilo Verpa/Folhapress, ILUSTRADA) |
Tudo começa por uma besteira: Janalice se deixou filmar em cena sexual com o namorado, e as imagens vão ao mundo. Sua vida na escola fica insuportável e seus pais a mandam passar uns tempos com parentes. Em lugar de paz, encontra estupro; para fugir frequenta a rua, e eis que o destino piora: é vendida como escrava sexual para sucessivos donos, até chegar à Guiana, vizinho que é uma abstração para o Brasil, mas destino de milhares de conterrâneos.
A trajetória de Janalice se mistura com a de um punhado de outros desesperados e desesperançados. O mundo do crack e do roubo pelos rios amazônicos encontra o de imigrantes ilegais, garimpo de ouro e imprensa sensacionalista, tudo compondo um horror sem fim de alta velocidade narrativa e de um muito bom resultado estético.
O reparo crítico possível aponta justamente para a virtuosa linguagem do livro: tendo optado por enxugar o discurso até o limite do suportável (as falas dos diálogos, sem travessões, sequer fazem mudar a linha do texto), o escritor nos deixa sem poder compartilhar da psicologia dos personagens. Daí seu desfecho seco. Antes dele, o sofrimento crescente, que "Pssica" oferece em uma narrativa marcante e assustadora.
LUÍS AUGUSTO FISCHER é professor de literatura da UFRGS
Livraria da Folha
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