CRÍTICA
'Mia Madre' aborda a intimidade com sobriedade e delicadeza
A filmografia do diretor italiano Nanni Moretti está cheia de referências pessoais, e duas obras –"Caro Diário" (1993) e "Aprile" (1998)– são francamente autobiográficas. Depois de ter se afastado desse universo em seus últimos longas, Moretti volta às origens em "Mia Madre". O filme conta a história de Margherita (Margherita Buy), uma cineasta que enfrenta a morte da mãe enquanto roda um filme. Moretti viveu o mesmo drama quando filmava o premonitório "Habemus Papam" (2011).
Neste, Moretti é Giovanni, o irmão da cineasta, cuja serenidade contrasta com o perfil irascível e angustiado de Margherita, uma espécie de alter ego feminino do diretor.
Professora de latim aposentada –como a mãe de Moretti–, Ada (Giulia Lazzarini) está hospitalizada, sem chance de recuperação. A narrativa alterna cenas no hospital, em que ela recebe visitas dos filhos, da neta e de amigos; momentos da rodagem do filme de Margherita, que fica cada vez mais tumultuada; e flashbacks –alguns deles oníricos.
Divulgação | ||
Cena do filme "Mia Madre" |
Parte da tensão das filmagens é responsabilidade de Barry Huggins (John Turturro), caprichoso ator americano que se destaca pelo narcisismo e pela incapacidade de decorar falas. Expansivo, Turturro não nega sua origem italiana e é o responsável pelos –poucos, mas excelentes– momentos de humor neste que é o mais íntimo e o menos cômico dos filmes de Moretti.
Além dos atritos com Barry e da situação da mãe, Margherita precisa lidar com a crise de adolescência da filha e com o fim de um relacionamento. Suas hesitações ganham proporções maiores quando comparadas à devoção de Giovanni, que pede demissão para se dedicar à mãe.
No centro de tudo está o luto. Margherita enfrenta a perda da mãe, mas também o luto de si mesma, sentimento moral relacionado com a frustração, a solidão e a lassitude que a rodeiam.
O latim, que Ada ensina à neta e transmitiu a gerações de alunos, é o legado que deixa à posteridade e uma forma de renascimento.
Com muita sobriedade e delicadeza, Moretti aborda os recônditos da intimidade sem cair no patético e,assim, encontra o universal.
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