Comediante britânico John Oliver repensa piadas na era Trump

MARCELO BERNARDES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM NOVA YORK

Não está sendo fácil posicionar a sátira política na TV americana nos tempos de Donald Trump. Na semana passada, Trey Parker, cocriador do desenho "South Park", que durante a última temporada fez piadas semanalmente sobre Trump, afirmou que não vai mais zombar o novo presidente americano quando a próxima temporada do programa estrear.

"É bem complicado agora porque a sátira se tornou realidade. Deixem eles fazerem a comédia deles, e fazemos a nossa", disse Parker a uma emissora australiana.

Para o comediante britânico John Oliver, o problema é outro: encontrar uma maneira esperta de fazer piadas, evitando que o ritmo frenético impresso neste início de gestão Trump -satirizado diariamente pelos talk shows e mídias sociais- não acabe tornando as risadas obsoletas.

Na segunda-feira (9), seis dias antes de a quarta temporada do popular programa "Last Week Tonight with John Oliver" ser lançada nos EUA, o apresentador ainda não fazia ideia de que linha seguir.

"Honestamente, já foi complicado em 2016. Muito do que Trump disse durante a campanha foi ridículo", afirmou. "E esse não é o processo da comédia, que funciona melhor se pegarmos uma notícia séria e zoarmos com ela."

No Brasil o programa estreia na quarta-feira (15), às 23h30, no canal HBO Plus.

Oliver, que conversou com a Folha numa ampla sala da sede da rede HBO, no centro de Nova York, disse estar também preocupado com a mudança da retórica de Trump, que passou de "ridícula" para "perigosa".

Um dos problemas, segundo o humorista, é Trump seguir criticando a cobertura da imprensa, chamando a mídia de desonesta. "Pensar que a imprensa é um partido de oposição é perigoso, mas afirmar isso publicamente é condenável", diz. "Vai ser um período difícil para os jornalistas. É por isso que eles precisam ser defendidos."

Oliver também reserva críticas à imprensa nas eleições. "Alguns jornalistas fizeram um trabalho terrível."

O longo processo eleitoral, segundo ele, tornou as pessoas aborrecidas. "No final, quando chegamos à mais importante fase, a imprensa começou a apresentar os fatos sobre os dois candidatos com uma falsa equivalência, criando um grande problema."

Embora Trump tenha gerado oito quadros principais nos 30 programas da última temporada de "Last Week Tonight", Oliver se gaba por ter conseguido manter o equilíbrio ao explorar outros temas caros a ele, como ciência e críticas a grandes empresas.

Até conseguiu que blogs conservadores elogiassem algumas de suas "conclusões", como foi o caso de um quadro sobre "confisco civil", esdrúxula e preocupante lei que autoriza a polícia a confiscar bens de uma pessoa, mesmo que ela não tenha sido formalmente acusada de um crime.

Mas o grande prazer de Oliver continua sendo direcionar temas de política internacional para o público americano. Nesta temporada, ele pretende falar sobre a eleição na França e voltar a comentar a crise brasileira, como tem feito nos dois últimos anos.

"Meu público assiste ao panelaço, acha engraçado e quer saber mais." Oliver diz que as TVs comerciais nos EUA ignoraram o escândalo da Petrobras. "Perderam uma grande oportunidade porque o que acontece no Brasil é, ao mesmo tempo que horrível, também muito engraçado."

NA TV
Last Week Tonight with John Oliver
Quando: às quartas, a partir de 15/2, às 23h30, no HBO Plus

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