crítica
Thriller 'O Bosque Soturno' é fiel ao estilo de Neil LaBute
Lenise Pinheiro/Folhapress | ||
Os atores Guta Ruiz e Pedro Bosnich em apresentação no Teatro Eva Herz |
Nada de novo na figura masculina escarrada do machismo falante em nome da falsa moral e da família. Algo de novo no retrato da mulher dona de seu nariz, intelectual bem-sucedida, mãe e esposa que não domestica o desejo -até a exumação de um crime abafar a assertividade feminista.
O espetáculo "O Bosque Soturno" é fiel ao estilo do dramaturgo e roteirista Neil LaBute. O diálogo mordaz, o inconsciente destravado e a fisgada cinematográfica de suas peças são legíveis na versão brasileira de "In a Forest, Dark and Deep" (2011, numa floresta escura e profunda, ao pé da letra).
A tradução de Flavio Moraes e a adaptação do também diretor Otávio Martins calibraram o adjetivo do título com a atmosfera de thriller.
Betty é chefe de departamento numa faculdade de artes. Casada, com filhos, certa noite ela vai ao chalé que já frequentou com sua família e há pouco o alugou a um aluno da mesma instituição. Uma vez vago, pede ao irmão, o marceneiro Bobby, para ajudá-la a organizar livros, objetos e afins visando novo inquilino.
Eles julgam conhecer bem um ao outro. Afinal, o pai os ensinou o quanto "a verdade dói". Temos o operário ressentido e a professora que prefere a via do prazer. Naquela noite chuvosa, contudo, a tentativa de colocar a casa em ordem vai transformá-los de modo perene.
Guta Ruiz é desprendida da presunção do perfil de pedagoga e gestora. Do espírito pessoal solar ao lado escuro, a transformação convence. O jeito descolado com que a personagem encara a aspereza do irmão muda radicalmente com a vertigem experimentada quando pressionada a religar os fatos em que se envolveu.
Pedro Bosnich mostra-se refém do papel de um homem estereotipado pela ignorância. Pouco explora a ambiguidade de quem é talhado pela força braçal e, apesar do rancor, surpreende ao dobrar a mulher a quem inveja, admira e ama fraternalmente.
A descompensação na dupla provoca desvios ao naturalismo de TV, seja na leveza ou na tensão dramáticas. Paradoxo de uma encenação que endossa a penumbra no desenho de luz e as paredes de caixotes de madeira, vazadas, no cenário. Infiltrações bem-vindas à linguagem realista da obra de LaBute.
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