Em noite justa, Grammy consagra os dois melhores álbuns do ano

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THALES DE MENEZES
DE SÃO PAULO

Depois de ser crivado de críticas variadas em suas últimas edições, como servir apenas para recompensar quem vende mais discos para salvar o mercado, o principal prêmio da indústria da música foi justo ao extremo em 2018, dando 12 estatuetas para os dois melhores álbuns da temporada.

As glórias da noite deste domingo (28), no Madison Square Garden, em Nova York, foram para Bruno Mars, que levou seis pequenos gramofones dourados para casa, e Kendrick Lamar, que ficou com cinco. É o reconhecimento para dois tipos evidentes de como fazer música relevante: ser conservador e impecável, ou ser inovador e irregular.

Bruno Mars não inventa muita coisa, mas sabe fazer o que gosta com uma qualidade irrepreensível. Com seu álbum "24K Magic", levou os três principais prêmios: Gravação do Ano, Álbum do Ano e Canção do Ano, este por "That's What I Like". Com a mesma canção, completou a sacola de prêmios em Melhor Performance de R&B, Canção de R&B e Álbum de R&B.

O disco "24K Magic", que recebeu ainda um sétimo prêmio, técnico, de Álbum com Melhor Engenharia de Som, parece um catálogo do melhor que se pode alcançar em música negra americana. Estão lá as baladas cantadas em falsete, os funks de rachar assoalho, o soul sensual.

Claro que Bruno Mars não existiria sem Michael Jackson, Prince ou Smokey Robinson, mas ele recebeu o bastão desses ídolos e prossegue seus estilos com exuberância técnica e personalidade.

É muito mais do que tenta, sem conseguir, o ator Donald Glover, que levou um Grammy com seu projeto musical, Childish Gambino. Sua música "Redbone" foi premiada como Performance de R&B Tradicional, mas, como todo o seu álbum, é emulação sem alma do que artistas do passado já fizeram. Tem muito a aprender com Mars.

Kendrick Lamar passou o rodo nas categorias de rap, premido por Canção, Álbum, Performance e Performance de Rap Cantado, categoria que foca músicas que misturam rap com canto. Esta ele levou com Rihanna, em "Loyalty". Seu quinto Grammy da noite veio com Melhor Clipe, para o hit

"HUMBLE."

Lamar é a prova de que o rap, e o hip hop como um todo, é o único gênero que está mostrando renovação e conteúdo relevante. Seu trabalho é irregular, mas a contundência nas letras e o risco sem medo nas construções musicais são impressionantes quando ele acerta.

Na apresentação que abriu a noite do Grammy, quando cantou trechos de várias músicas de seu álbum mais recente, Lamar deixou claro a força de seu arsenal de ritmo e poesia.

Pena que o resto da cerimônia não segurou a qualidade nas performances que se seguiram. Ninguém criou uma solução visual inovadora, e o pouco de emoção veio de momentos como o choro de Kesha em "Praying", que cantou acompanhada de várias vocalistas de apoio, entre elas o recente fenômeno teen Camila Cabello e a veterana Cyndi Lauper. A canção foi um desabafo de Kesha sobre os problemas que teve com o antigo empresário, que acusa de assédio.

Kesha formou com Lady Gaga, Pink e Miley Cyrus um time de "meninas sérias" nas apresentações da noite. Todas discretas, até no guarda-roupa, cantando temas dramáticos e assumindo uma atitude que parecia dizer "sabemos cantar e podemos subir ao palco sem mostrar o corpo". Miley merece um comentário extra: quando os produtores do Grammy resolvem homenagear Elton John, um ícone do pop prestes a se aposentar, colocam o ídolo para cantar "Tiny Dancer" com Miley Cyrus. Sinal triste dos tempos, como se os jovens que estavam vendo pela TV não fossem dar bola para aquele tiozinho no piano sem o chamariz da menina famosa a seu lado. Pior é isso ser a pura verdade.

"Despacito", a "Macarena" do século 21 e canção mais executada no mundo nos últimos meses, concorreu nas principais categorias sem levar nada. Cumpriu uma espécie de "cota de exotismo" na premiação, visando a grande audiência latina. Mas foi esnobada, a ponto de Luis Fonsi, Daddy Yankee e Justin Bieber perderem até na categoria Performance Pop de Duo ou Grupo para a banda medíocre Portugal. The Man.

Acostumado a ser contemplado com muitas indicações, Ed Sheeran nem foi ao prêmio, mas acabou se dando bem e vai receber duas estatuetas pelo correio: Performance Pop Solo, com "Shape of You", e Álbum Vocal Pop, com "Divide". O rock expôs o momento crítico do gênero, com premiados estranhos como o genial Leonard Cohen, que levou melhor Performance de Rock mais como homenagem póstuma, e a vitória de Performance de Metal para o Mastodon, um grupo pesado fraquinho que apenas o Grammy leva a sério.

A apenas esforçada Alessia Cara ganhou como Artista Revelação, categoria em que muitos acreditavam na vitória de SZA, indicada a cinco estatuetas em sua estreia no Grammy. Não levou nenhuma e fez uma performance frouxa. Será só mais uma cantora nesse mercado infestado por vozes femininas em demasia.

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