"Minha Amiga do Parque" chega ao Brasil mais de dois anos após a estreia argentina. Dirigido e estrelado por Ana Katz, conta com nomes do cinema latino-americano, como Julieta Zylberberg, Daniel Hendler e Mirella Pascual.
Hendler, um dos rostos do "novo cinema argentino", interpreta Gustavo, marido de Liz (Zylberberg), que acaba de ter o filho dos dois e está só em um apartamento. O rapaz foi para uma montanha, a quilômetros de distância, gravar um documentário.
Enquanto isso, Mirella Pascual, olhos tristes, vive a babá (Yasmina). É a atriz de "Whisky", clássico uruguaio dos anos 2000. (Clássico por clássico, Zylberberg protagonizou "O Olhar Invisível", filme de 2011, de Diego Lerman, da geração de Hendler.)
Com tantos pontos interligados e ainda a mão firme de Inés Bortagaray no roteiro —ao lado de Katz—, "Minha Amiga do Parque" é hábil ao lidar com as paranoias contemporâneas, incluindo a maternidade e a violência.
Esqueçam o lado colorido dos comerciais, em que as mulheres, pelo único fato de serem mães, têm de ser iguais e felizes. Esqueçam também o reverso: a depressão, a infelicidade crônica.
As roteiristas colocam Liz e Rosa (vivida por Ana Katz) como parceiras improváveis, pajeando crianças pequenas. Mulheres diferentes mas que, de tão diferentes, carregam a tensão que vai se cristalizando até os últimos minutos.
As duas se conhecem em um parque, entre árvores, brinquedinhos para bebês e muitas dúvidas. Existe algo em Rosa que atrai Liz, talvez a liberdade. O fato é que tudo transborda com a chegada da irmã de Rosa. A certa altura tememos pelo pior, com uma reencenação do crime das irmãs Papin, que se tornaram uma das vinhetas psicanalíticas do século 20.
Rosa, por ser a "loser" esquisita, lembra a dinâmica de "O Homem Ao Lado" (2009), dos argentinos Mariano Cohn e Gastón Duprat. Ela desestrutura e confunde Liz. Em "O Homem Ao Lado", Victor desestabilizava o certinho e hypadíssimo Leonardo.
Há uma coleção de nuances que, ao longo do filme, demonstra a segurança de Katz e agrada sobretudo pelo olhar feminino que não se contenta em ser o estereótipo do "feminino". Nada como distorcer os cânones por dentro. "Minha Amiga do Parque" fala do desejo por uma vida sem beatitudes e cheia de abismos.
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