Descrição de chapéu Moda

Semana de Moda de NY se revigora ao preterir imagem comercial

São Paulo

Ainda que no balaio das semanas de moda a repetição sobreponha o exercício de criar novas imagens de estilo, o início do circuito internacional de prêt-à-porter outono-inverno 2018/2019 abriu fendas que podem iluminar um futuro mais autêntico do que o pintado nas temporadas monótonas desta década.

​Nova York, o centro da relação escancarada entre comércio e passarela, deixou de respirar por aparelhos ao assumir que a fórmula de alinhar varejo e desfile não convence mais --mesmo que no pós-crise de 2008 ela tenha segurado, momentaneamente, as receitas de suas marcas.

Uma mudança nos três poderes da alta casta da cidade, que consolida modismos mas tinha perdido a capacidade de criá-los, baliza o tabuleiro, que dá adeus a Carolina Herrera (leia mais ao lado), consagra a Calvin Klein e traz de volta um inspirado Marc Jacobs.

Jacobs, a cabeça mais pulsante da temporada, pesou a tesoura na estética do absurdo para mostrar que, mesmo tendo que aguentar um novo "diretor criativo contemporâneo" em sua marca homônima, uma exigência do grupo LVMH para turbinar vendas deficitárias, moda sobrevive de brilhantismo.

Não é à toda que ele evoca os 1980 de Yves Saint Laurent, o designer que lidou primeiro com a pressão comercial ao abrir os mercados e listar sua grife na bolsa.

Ombros exagerados fizeram par com silhuetas ampliadas, blocos de cores fortes com estampas comedidas e calças culotes produziram a amazonas moderna do estilista que modernizou a Louis Vuitton, fez parcerias com artistas e introduziu teatralidade na indústria do consumo.

Um recomeço comparável ao da Calvin Klein, que mostra a sagacidade do novo "maior estilista da atualidade": o belga Raf Simons.

Ex-Dior, o designer segue os passos de Jacobs ao engendrar parcerias com artistas e instituições --imagens cedidas pela Fundação Andy Warhol e personagens do estúdio Looney Tunes dispararam nas camadas de roupas.

A cruzada de Simons é pela desconstrução do sonho americano. Estampas dos personagens Papa-Léguas e Coiote parecem emular o discurso maniqueísta do presidente americano Donald Trump e dos radicais terroristas.

No desenho, ambientado nas regiões desertificadas dos EUA onde sobram os caubóis dos quais o estilista tirou detalhes da indumentária, as bombas do vilão (Trump?) não surtem efeito. A artilharia provoca caos, mas de alguma maneira o Papa-Léguas (o mundo?) o humilha, fazendo-o provar do próprio veneno.

Simons propõe, assim, a roupa antiemboscada, o uniforme do apocalipse.

O mylar, material prateado resistente ao fogo e usado por equipes de salvamento, virou base para capas, saias e bolsas; balaclavas, que cobrem quase todo o rosto, viraram acessório de cabeça; detalhes de roupa sinalizadora foram aplicadas nos conjuntos laranjas, tipo os de bombeiro (no Brasil, o uniforme de gari); e pesados casacos de lã feitos para proteger do frio.

A tese do designer foi apresentada em plena bolsa de valores de NY, símbolo do poderio americano, num sala forrada com 50 mil galões de pipocas. Um sinal de que, na panela de pressão de Nova York, a moda volta a apostar alto jogando tudo para cima.

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.