Descrição de chapéu

'A Número Um' privilegia a nuance e interroga o que pode o empoderamento

Longa evita a abstração ou a idealização e fornece antídotos aos preconceitos

Cássio Starling Carlos
São Paulo

A NÚMERO UM

  • Quando estreia nesta quinta (8)
  • Produção França, 2017, 14 anos
  • Direção Tonie Marshall

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Uma executiva escuta no celular uma mensagem masculina anônima com conteúdo sexual agressivo. Em seguida, leva um esbarrão de outra mulher, que segue sem nem se desculpar.

As duas situações postas logo na cena de abertura de “A Número Um” estabelecem os tópicos em torno dos quais a diretora Tonie Marshall, em colaboração frutuosa com a jornalista Raphaëlle Bacqué na preparação do roteiro, constrói uma narrativa focalizada nas múltiplas faces do empoderamento.

A Número um. Dir:  Tonie Marshall
Emmanuelle Devos (Emmanuelle Blachey) é uma executiva no reino masculinista dos CEO - Divulgação

Emmanuelle Blachey (Emmanuelle Devos, justa como sempre) é uma profissional em rara posição de poder no reino masculinista dos CEO. A morte anunciada de um alto executivo de uma das maiores empresas da França leva um grupo feminista a atraí-la para convencê-la a disputar o cobiçado cargo.

A trajetória da personagem poderia ser reduzido a um esqueleto demonstrativo, reafirmando o que sabemos, que mulheres e homens têm as mesmas competências, mas são reconhecidos de modo desequilibrado, quando não desonesto.

O filme não deixa de ilustrar essa situação com pequenos toques que dizem muito, assim como não apaga as outras faces da personagem central, de mãe, esposa e filha preocupada com a saúde do pai. Desse modo, as roteiristas evitam a abstração ou a idealização e fornecem antídotos aos preconceitos, desafiando o retrato um tanto homogêneo que as lutas identitárias tendem a projetar.

De início, Blachey diz duvidar da solidariedade feminina, desconfiando ter sido escolhida apenas como parte de uma bem articulada estratégia de ascensão ao poder. Marshall e Bacqué também representam com ironia a ideia de um bloco coeso, permeando o filme com subterfúgios, inclusive sexuais, praticados por ambas as partes.

Outra vantagem é não resumir tudo à luta por poder, incluindo situações de desejos e de afetos que determinam os diversos níveis das relações entre os gêneros, pondo em cena as fragilidades e dizendo que estas não se confundem com fraquezas.

Assim, o que “A Número Um” consegue, ao privilegiar a nuance, é relativizar a noção de força e de conquista e, nesse sentido, interrogar o que pode o empoderamento.

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