Em seis décadas estudando formigas e suas colônias, o biólogo Edward O. Wilson costuma ressaltar um ponto que em seus livros: os humanos e os insetos veem o mundo de modo muito diferente.

Os dois olhos do animal, compostos de múltiplas lentes, não rendem imagens de boa resolução, mas são melhores que o olho humano para captar movimentos rápidos e a polarização da luz. Há espécies com três olhos extras, que auxiliam a orientação.

Mas como uma formiga vê o mundo? É essa resposta que o quadrinista canadense Michael DeForge, 31, busca em seu álbum "Formigueiro", sem compromisso científico.

Baseando-se só em conhecimento popular, apela para a imaginação visual, senso de humor peculiar e mostra a dificuldade de comparar espécies.

Começa pelo formato das formigas. Os corpos parecem saídos da ficção científica japonesa ou de pinturas religiosas hindu, com protuberâncias que lembram coques de cabelo, vísceras à mostra e muitas, muitas cores.

Predadores e outros animais que circundam formigueiros também ganham outras formas: aranhas são gigantes que andam sobre múltiplas patas, com cara de lobo de desenho animado. Uma centopeia é uma limusine avantajada.

O visual é o ponto de partida para "Formigueiro" flertar com as fábulas. As formigas falam como seres humanos e têm comportamentos parecidos. Mas, nesse mundo tão alienígena, como funcionam interações humanas como amor, humor, preconceito, religião, subsistência, guerra?

DeForge pensou suas histórias inicialmente como uma espécie de tirinha, publicada na internet em episódios com a devida piadinha no final.

Há outras aproximações com o mundo humano. O Estado explorador é a rainha que exige depósitos semanais de esperma. Drogas são secreções que aranhas soltam depois que transam. Alucinadas com a droga, formigas vermelhas começam uma guerra com as pretas "" o que rende o panorama mais insano da obra.

Se fábulas são histórias em que os bichos ganham características humanas, DeForge parece querer mostrar que, se você tenta comparar relações humanas com as relações no formigueiro, percebe como este é um mundo alienígena.

O autor é conhecido como um dos mais produtivos da nova geração. Já publicou sete coletâneas e graphic novels, além de diversas minicomics e da série anual "Lose". Seu ganha-pão é o trabalho diário como designer do desenho animado "Hora de Aventura".