Descrição de chapéu Artes Cênicas

Musicais reavivam memória afetiva de clássicos infantojuvenis

Montagens de 'A Noviça Rebelde' e 'A Pequena Sereia' estreiam em São Paulo

Malu Rodrigues (esq.), a Maria, e Gabriel Braga Nunes (dir.), o Capitão, com as crianças da família Von Trapp na montagem de ‘A Noviça Rebelde’ por Charles Möeller e Claudio Botelho - Eduardo Anizelli/Folhapress
MLB
São Paulo

Seja nas notas singelas de "Dó-Ré-Mi" ou no canto de uma pequena sereia da Disney, musicais que chegam a São Paulo nesta semana buscam reavivar a memória de clássicos infantojuvenis.

Charles Möeller e Claudio Botelho não só resgatam uma obra de renome mas também revisitam a sua própria história em "A Noviça Rebelde", que estreia nesta quarta (28).

É a segunda vez que os encenadores se debruçam sobre o musical de Richard Rodgers e Oscar Hammerstein —a primeira foi há exatos dez anos.

Agora, dizem, investiram no lado mais humano dos personagens, buscando reflexos da verdadeira família Von Trapp, na qual a história é baseada.

Maria Kutschera foi de fato uma noviça enviada a cuidar dos sete filhos do viúvo barão Von Trapp em sua mansão em Salzburgo. Depois casou-se com o patriarca e fez da família um coral de renome. Fugiram da ocupação nazista da Áustria, em 1938, em direção aos EUA, sempre passando por altos e baixos financeiros.

A austríaca versou a história num livro de memórias, que figurou na lista de best-sellers e depois virou o filme alemão "A Família Trapp" (1956), também de sucesso.

Mas foi o musical da Broadway "A Noviça Rebelde" (1959), adaptado seis anos depois ao cinema, que impulsionou a história dos Von Trapp — o filme é ainda hoje a terceira maior bilheteria da história dos EUA, em valores corrigidos, segundo o site Box Mojo.

Seria uma peça com músicas tradicionais, como as que cantavam a família original, mas Rodgers e Hammerstein, respectivamente compositor e letrista, viram potencial para um musical, diz à Folha Ted Chapin, que há 30 anos preside as organizações da dupla.

Segundo ele, Rodgers e Hammerstein "eram bons homens de negócio". Fizeram na primeira metade do século 20 algo até então sem precedentes: administrar, eles mesmos, os direitos autorais de sua obra, que abrange de "Oklahoma!" a "O Rei e Eu".

Em "A Noviça Rebelde", não se prenderam à realidade, açucarando a história dos Von Trapp. Também criaram músicas joviais e fáceis.

"Eles sabiam ser simples, mas nunca simplistas. Não complicavam o que não precisava de rebuscamento", afirma Chapin. "E as músicas deles sempre têm um toque do local que é retratado."

Tanto que "Edelweiss", referência à flor branca que nasce nas montanhas em meio à neve, é tida por muitos como um hino austríaco, quando na verdade foi criada pela dupla de americanos, explica Botelho, que assina as versões em português das canções.

"É uma metáfora linda de resistência", continua Möeller. "E, quando 'A Noviça Rebelde' estreou, o eco do nazismo ainda era muito forte."

Na sua nova versão, Möeller e Botelho também retomam parte do elenco de 2008, mas em papéis diferentes.

Malu Rodrigues, 24, que antes interpretava a filha Louisa, agora viverá a protagonista Maria. Como tem uma idade próxima à da personagem (geralmente as atrizes são mais velhas), diz trazer "uma coisa moleca" ao papel.

Já a atriz e cantora Larissa Manoela, 17, que fez a caçula, Gretl, na primeira montagem, será Leisel, a filha mais velha.

A dupla de diretores, que costuma escalar artistas de outras áreas para suas produções, também traz Marcelo Serrado no papel do tio Max, e Gabriel Braga Nunes como o capitão Von Trapp, seu primeiro trabalho em musicais.

A produção, orçada em R$ 10 milhões, conta com um cenário do inglês David Harris, responsável por projetos como o de "Les Misérables".

Ele faz aqui uma estrutura neutra com efeitos de luz, lembrando pinturas, como se fossem as aquarelas das crianças, segundo Möeller.

São seis projetores, dentro e fora do palco, que "criam imagens vivas", comenta o diretor de produção Vinícius Munhoz, da Atelier de Cultura. "É quase uma mescla entre cinema e teatro."

Para o próximo ano, Möeller e Botelho preparam outra remontagem. "O Despertar da Primavera", que fizeram em 2009, terá nova versão com estreia em abril no Teatro Porto Seguro, em São Paulo.

A NOVIÇA REBELDE

  • Quando qua. a sex, às 21h, sáb., às 16h e 21h, dom., às 15h e 20h; de 28/3 a 27/5
  • Onde Teatro Renault, av. Brigadeiro Luis Antônio, 411, tel. (11) 4003-5588
  • Preço R$ 75 a R$ 310
  • Classificação livre

 

NO MAR

"A Pequena Sereia" que se verá a partir desta sexta (30), em São Paulo, tem toques de brasilidade: vitórias-régias adornam uma gruta, há um quê de samba em "No Nosso Mar" (versão da música "Under the Sea"), e o caranguejo Sebastião (Tiago Abravanel) tem sotaque nordestino.

É a primeira montagem brasileira de um musical da Disney que não é franqueada —quando a encenação obedece ao padrão estrangeiro, trazendo de fora cenários, figurinos e equipe criativa.

Foi um processo de negociação que durou três anos, diz Stephanie Mayorkis, que produz com a IMM o espetáculo, autorizado a captar R$ 9,9 milhões via Lei Rouanet.

Mesmo assim, a diretora artística e coreógrafa da montagem, a americana Lynne Kurdziel-Formato, foi uma indicação da Disney. Ela já trabalhou numa versão dinamarquesa do musical.

Não há alterações na história, sobre a sereia (interpretada aqui por Fabi Bang) que se apaixona por um humano e aceita trocar sua bela voz por uma vida na superfície.

A adaptação do desenho, responsável pelo renascimento dos estúdios Disney no final dos anos 1980 (leia abaixo), chegou ao teatro em 2008, numa produção feita sobre patins. Sofreu mudanças quatro anos depois, que eliminaram a patinação e incluíram outros efeitos —é esta a que será vista no país.

Há uma série de traquitanas para transformar o fundo do mar da animação em teatro. Entre eles alguns voos, feitos com cabos.

Noutros momentos, seres marítimos se locomovem ora ondulando o corpo, como se nadassem, ora sendo levantados por outros atores. Estes, com roupas esvoaçantes, lembram algas ou a própria água.

"Estamos usando antigas técnicas teatrais", afirma Lynne. "As sereias têm um andar inspirado na Ópera de Pequim, que, em conjunto com as suas saias, cria uma sensação de estarem flutuando."

Os figurinos de Fábio Namatame não reproduzem literalmente os animais. O peixinho Linguado (Lucas Cândido) mantém as características humanas, porém traz os listrados azul e amarelo que lhe são característicos. Não há rabos de sereia, mas saias cujo corte lembra uma cauda.

Da protagonista, são dez figurinos e 15 trocas de roupa, feitas numa média de 40 segundos. "Estou o tempo inteiro em atividade. Não tenho muito repouso", brinca Fabi.

Já o Sebastião de Abravanel tem um falar quase todo baiano, com pitadas de expressões e interjeições de outros locais do Nordeste.

Também inclui no meio de "No Fundo do Mar" um "escama só de peixe", do hit "Envolvimento", de MC Loma. "A gente tenta trazer algumas coisas da atualidade", diz o ator. "Estávamos ensaiando quando MC Loma explodiu. Ela levantou para eu cortar."

A PEQUENA SEREIA

  • Quando qui. e sex., às 21h, sáb,. às 16h e 20h, dom., às 15h e 19h; de 30/3 a 29/7
  • Onde Teatro Santander - complexo do shopping JK, av. Juscelino Kubitschek, 2.041, tel. (11) 4810-6868
  • Preço R$ 75 a R$ 280
  • Classificação livre

 

Ao criar, vivemos 'A Pequena Sereia', recorda compositor

O compositor Alan Menken, 68, foi uma das pessoas envolvidas no chamado renascimento da Disney no fim dos anos 1980. O estúdio passava por uma crise e decidiu mudar o seu quadro.

Apostou numa adaptação de "A Pequena Sereia", de Hans Christian Andersen, filme que daria início a uma era de ouro da Disney.

Menken assinou as músicas com o letrista Howard Ashmancom quem tivera um sucesso off-Broadway na comédia de terror "Little Shop of Horrors" (1992).

Com a animação, levou o Oscar de melhor canção ("Under the Sea") e trilha sonora, as duas primeiras de suas atuais oito estatuetas.

A dupla transportou a história, originalmente dinamarquesa, ao Caribe, usando nas músicas ritmos como o calipso e elementos do mar, como o som de conchas, explica Menken à Folha, por email. Também deram ao caranguejo Sebastião um sotaque jamaicano.

Animação "A Pequena Sereia" (1989), da Disney - Reprodução

"Enquanto criamos, nós realmente interpretávamos os personagens e os diálogos e nos imaginávamos dentro da ação e da cena."

Menken, que assinou ainda trilhas de "A Bela e a Fera", "Aladdin", "O Corcunda de Notre-Dame" e "Pocahontas", depois esteve a cargo das adaptações da Disney para teatro, primeiro com "A Bela e a Fera" (1994).

No caso de "A Pequena Sereia" (2008), criou novas composições (antes eram apenas seis) com o letrista Glenn SlaterAshman morrera em 1991. Na trilha, além do caribenho, incluíram ritmos de rock sessentista, cabaré e vaudeville.

"Essa decisão de recriar o estilo de um musical é muito difícil. Acaba sendo um impulso instintivo, pensando: o que poderia complementar aquilo que já criamos?", diz Menken.

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