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Livros

Obra inquire sobre como pensar judaicamente

Em 'O Espírito do Judaísmo', Bernard-Henri Lévy revê a própria trajetória à luz de sua religião

LUIZ FELIPE PONDÉ

O Espírito do Judaísmo

  • Preço R$ 57,90 (320 págs.)
  • Autor Bernard-Henry Lévy
  • Editora Três Estrelas

Bernard-Henri Lévy, autor de "O Espírito do Judaísmo", recém-publicado pela Três Estrelas, selo editorial do Grupo Folha, é conhecido por ser "multimídia": além de filósofo, é jornalista e cineasta.

Esse ecletismo já lhe custou muita difamação entre os intelectuais franceses metodologicamente conservadores. Mas esses "caretas do espírito" se enganam: o ecletismo de Lévy está a serviço da densidade de seu pensamento, e não o contrário.

O "conflito metodológico" é uma marca do autor. E essa marca é uma das riquezas do seu "Espírito do Judaísmo". O judaísmo é um espírito que se declina no embate, e isso é muito claro nessa obra.

Nos anos 1980, ele e mais dois jovens pensadores franceses e judeus, André Glucksmann (morto em 2015) e Alain Finkielkraut, escandalizaram a intelectualidade de seu país ao romperem com o marxismo como hermenêutica.

O filósofo francês Bernard-Henri Lévy, que tem seu "O Espírito do Judaísmo" lançado no Brasil pela Três Estrelas
O filósofo francês Bernard-Henri Lévy - JFPaga/Grasset/Divulgação

Além dessa heresia, os três autores tinham cara de galã, faziam aparições na mídia de massa e em programas femininos. Cabeludos na época, os três "novos filósofos", como eram chamados, fizeram carreira. Lévy é, sem dúvida, o mais heterodoxo em seu percurso metodológico.

Nessa obra peculiar, temos temas e autores que se entrecruzam, dando a ela um ar judaico um pouco ao sabor dos comentários rabínicos.

Tais comentários carregam em si a marca de, partindo do texto sagrado judaico —o Tanach, a Bíblia Hebraica, chamada de "Velho Testamento" pelo cristãos, cujos cinco primeiros livros se constituem na Torá—, refletir livremente e muitas vezes de modo "poético", sobre a vida, a história, a espiritualidade e o futuro.

Três são as principais referências do autor, segundo ele próprio afirma na obra (entre muitas outras, que vão de René Girard a Jacques Lacan) —o comentador e rabino Rashi (1040-1105), judeu francês medieval, e dois filósofos judeus contemporâneos, Emmanuel Levinas (1906-1995) e Franz Rosenzweig (1886- 1929).

Se Levinas (cuja filosofia afirma a primazia da ética sobre a ontologia, muito "judaicamente") é razoavelmente conhecido no Brasil, Rosenzweig permanece uma lacuna nas publicações brasileiras (com sua "Estrela da Redenção", marcou profundamente autores como o próprio Levinas e os frankfurtianos).

O modo como Lévy narra a relação entre seu "Le Testament de Dieu" (1978) e este "O Espírito do Judaísmo" lembra de modo claro o estilo de Rosenzweig ao narrar seu reencontro dramático com o judaísmo, herança posta em seu nome e seu sangue. O "transtorno intelectual" em ambos é similar: como pensar judaicamente?

Lévy se lança numa reflexão em que o judaísmo, e sua condição de judeu, membro do "povo-tesouro" de Deus, lhe servem como hermenêutica para pensar seu trajeto de intelectual, cineasta e ativista pelos direitos humanos.

Ele relê sua vida, agora, de forma "judaica". Usando Jonas, o profeta de Nínive, "a Babilônia", portanto, o profeta do "outro dos judeus", Lévy busca compreender o significado dessa condição de tesouro de Deus no mundo: um povo atravessado pelo imperativo do pensamento, do diálogo e do conflito.

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