Descrição de chapéu artes plásticas

Inspirada no festival Burning Man, curadora do Smithsonian critica mercado da arte

Para Nora Atkinson, relação com arte deveria ser redefinida levando em conta a conexão emocional que geram

Amanda Nogueira
São Paulo

Nora Atkinson, curadora do instituto americano Smithsonian, criticou os valores que movem o mercado de arte contemporânea durante sua palestra no TED, conferência que reúne líderes e pesquisadores de diversas áreas de estudo em Vancouver, no Canadá, nesta quinta (12).

Para ela, hoje em dia a compra e a venda de obras de arte costumam ganhar mais atenção do que os próprios trabalhos. Em sua visão, relação com arte deveria ser redefinida levando em conta a conexão emocional que geram​.

Atkinson cita como exemplos o leiloamento de uma pintura de Basquiat por US$ 110 milhões e a venda de uma pintura de Leonardo Da Vinci por US$ 450 milhões. "Esses são dois importantes artistas, mas, ainda assim, quando você olha para essas obras e para as manchetes você deve se perguntar: 'eu me importo com isso porque [essas peças] mexem comigo ou me importo com elas porque são caras?'", questiona.

"No mundo da arte contemporânea, é difícil separar essas duas coisas, mas e se a gente tentasse? E se a gente redefinisse o valor da arte não pelo seu preço, mas pela conexão emocional que ela cria entre o artista e o público ou o benefício que traz à nossa sociedade ou até mesmo a satisfação que dá aos próprios artistas?".

Atkinson se inspira no festival Burning Man, que acontece anualmente no deserto de Black Rock, no Estado americano de Nevada, para propor uma relação alternativa com a arte, sem sofrer interferências do mercado ou de críticas especializadas.

Anualmente, cerca de 70 mil pessoas acampam no deserto durante a primeira semana de agosto. A paisagem inóspita fica repleta de obras de arte, geralmente de humor irreverente e dimensões audaciosas, criadas especialmente para aquela ocasião.

"O que mais me fascina não é a qualidade da obra, que é bastante elevada, mas por que as pessoas vão para o deserto de novo e de novo para sujar as mãos e criarem por conta própria, na nossa era cada vez mais digital?", diz Atkinson.

Na visão da curadora, todo o acampamento do Burning Man poderia ser visto como uma instalação de arte interativa, conduzida pela interação de todos os presentes. "O que coloca isso à parte do mundo da arte comercial é que todos que criam arte podem exibi-la", diz.

Segundo Atkinson, que estuda o festival para uma exposição do instituto, há cerca de 300 instalações de arte na Playa [espaço do Burning Man dedicado a expor as obras de arte], mas nenhuma é vendida. Muitas são queimadas ao fim do evento; outras são desmontadas e guardadas pelos criadores.

"Todo ano, algo convence pessoas de diferentes estilos de vida e de toda a parte do mundo para ir ao deserto e criar arte quando não há nenhum dinheiro envolvido. O trabalho nem sempre é refinado, não é sempre viável, não é nem sempre bom, mas é autêntico e otimista de uma maneira que raramente vemos em nenhum outro lugar", diz.

Para ela, é reconfortante saber que a gente continua capaz de criar grandes obras frutos da imaginação em "tempos de cinismo". "E quando procuramos por conexão, a gente se une e constrói catedrais na poeira", diz a curadora, fazendo referência aos templos efêmeros construídos e destruídos no festival.

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