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Poemas instantâneos de Rupi Kaur prendem leitor em clichês

Sucesso em forma de likes limita amadurecimento da escrita e atuação de editor

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Rupi Kaur em festival literário em Jaipur, na Índia - Raj K Raj/Hindustan Times via Getty Images
Giovanna Dealtry
Professora de literatura brasileira na Uerj

O que o Sol Faz com as Flores

  • Preço R$ 34,90 (256 págs.)
  • Autoria Rupi Kaur
  • Editora Planeta
  • Tradução Ana Guadalupe

Desde a popularização das redes sociais, novas formas de pensar a relação entre escrita e esses suportes têm estado em pauta. Plataformas como Instagram e Facebook servem tanto à divulgação de textos como estabelecem novas formas de escrita a partir dos limites impostos pelo meio.

A discussão entre literatura e seus suportes não surgiu agora. Basta olharmos para o século 19 e o aparecimento do folhetim nos jornais. Escritores como Balzac tornaram-se mestres —e populares— ao equilibrarem forma romanesca, técnicas folhetinescas e conhecimento do público.

A grande diferença da produção surgida nas plataformas virtuais diz respeito ao contato sem intermediações entre autor e leitor. E, entre os milhares de poetas e prosadores que mantêm perfis nas redes, alguns conseguirão atrair a atenção dessa multidão dispersa e, assim, do mercado editorial, sempre em busca de apostas de baixo risco.

Nem sempre, porém, a escrita que encontra sustentação nas redes fica de pé quando passa ao livro e enfrenta a solidão da leitura não imediatista. Esse é o caso de "O que o Sol Faz com as Flores", segundo livro da poeta, ilustradora e performer indiano-canadense Rupi Kaur.

Dividido em cinco partes —murchar, cair, enraizar, crescer e florescer—, o volume privilegia a mesma fórmula fácil de comunicação de sua estreia, "Outros Jeitos de Usar a Boca", cujas vendas ultrapassaram os 2 milhões de exemplares. Seu sucesso, sem dúvida, está ligado aos relatos das experiências pessoais a partir de uma perspectiva feminista.

No entanto, como sugerem os títulos das seções, essa voz autobiográfica não se farta de explorar o didatismo e o lugar-comum. Assim, acompanhamos no livro a trajetória dessa voz desde a perda amorosa —"murchar" e "cair"— passando pela (re)descoberta das origens familiares até o renascimento/florescer como mulher independente, dona de si.

O consumo nas redes talvez não cause a sensação de esvaziamento, mas a fórmula dos poemas instantâneos, mais próximos de uma ideia do que da elaboração de um verso, somada a soluções óbvias, quase sempre melodramáticas, em vez de expandirem o poema reforçam a sensação de estarmos presos nos mesmos clichês ("você não acorda um belo dia e se transforma em borboleta").

Kaur tem 2,5 milhões de seguidores no Instagram, e é possível entender como alguém que escreva sobre amor, perdas, medo de maneira acessível encontre uma legião de fãs. O problema desse novo perfil de escritor é que o sucesso em forma de likes impede tanto o amadurecimento da escrita quando a intervenção de um editor.

 
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