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Cinema

'Tropikaoslista' associa bom personagem com panorama cultural sob a ditadura

Rogério Duarte marcou gerações de criadores dos anos 60 como poucos

Rogério Duarte, retratatado no documentário "Tropikaoslista"
Rogério Duarte, no documentário "Tropikaoslista" - Divulgação
Inácio Araujo
São Paulo

Rogério Duarte, o Tropikaoslista

  • Quando em cartaz
  • Produção Brasil, 2017, 12 anos
  • Direção José Walter Lima

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“Tropikaoslista” começa por achar um bom personagem, na pessoa de Rogério Duarte, intelectual múltiplo (de designer a compositor) que marcou como poucos gerações de criadores dos anos 60.

Em seguida, o diretor José Walter Lima toma outra boa providência, que consiste em narrar a trajetória dele sem recorrer a depoimentos, que não os do próprio. Com isso, intervenções exteriores surgem na forma de poemas (Carlos Rennó) ou músicas (Gil e Caetano).

Como acontece com frequência, essa história começa na Bahia, na agitação cultural de Salvador dos anos 1950, e prossegue no Rio, para onde Duarte vai em 1962, logo se ligando ao designer Aloísio Magalhães e ao CPC da UNE, do qual se torna diretor de arte.

Como acrescenta a isso um amplo cenário do que foram as artes brasileiras à época (Helio Oiticica, Lygia Clark, Glauber Rocha), o filme se abre promovendo uma rica associação entre o personagem —que circula e influencia tantas atividades— e, como decorrência, anunciando o panorama da atividade cultural sob a ditadura.

O que ocorre depois é o exílio interior (“inxílio”, ele denomina). E a obra o segue em sua deriva: esconderijo, trabalho como agricultor, misticismo. 

Se isso permite conhecer melhor sua trajetória, vivacidade, capacidade de adaptação ligada a uma percepção intelectual privilegiada, de algum modo também distancia o filme daquilo que anunciara.

Ou seja: deixa no ar a pergunta sobre o destino dessa geração. O que, afinal, ela produziu de efêmero ou duradouro? O que resta ou restou desse momento a um tempo tétrico e luminoso?

“Tropikaoslista” segue o caminho inverso ao de “Uma Noite em 67”, que, partindo de uma noite em um festival de música, acaba produzindo uma imagem forte da época. 

Temos de início um Rogério Duarte ativo na vida intelectual, circulando por diversos meios, produzindo. Temos no final um Rogério Duarte sempre interessante e intransigente, mas retirado e místico.

Talvez corresponda, com exceção dos personagens forçosamente midiáticos (Gil, Caetano), à trajetória da geração. 

Na segunda parte, o filme se separa um tanto daquilo, mais amplo, que promete no início. Pode ser culpa do Brasil ou de as coisas terem se passado com ele como se passaram.

O longa se enfraquece, mas sem nunca se perder, sem trair o personagem, sem jamais se valer de facilidades que tanto contribuem para levar certos filmes ao sucesso.

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