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Com grandes autores por vezes isso acontece. O penúltimo filme de Philippe Garrel, "À Sombra de Duas Mulheres" (2015), estreia só agora no país, depois de seu último longa ("O Amante de Um Dia") ter estreado em março.
E se o lançamento demora muito, o cinéfilo mais ansioso já vai ter visto e revisto o filme de formas menos nobres. Vai ter opinião formada sobre ele e pode querer economizar o preço do ingresso, que, convenhamos, está longe de ser uma pechincha.
Que o espectador não se desmotive com o atraso. "À Sombra de Duas Mulheres" é o melhor longa do diretor desde "Os Amantes Constantes" (2005), o que não é pouco. É seu filme mais enxuto em anos, e o mais tocante.
Pierre (Stanislas Merhar) é um cineasta independente, pobre, mas autoral, que trabalha com a mulher, Manon (Clotilde Courau), num filme sobre a resistência francesa à ocupação alemã durante a Segunda Guerra Mundial.
Ele conhece a estagiária da cinemateca, Elisabeth (Lena Paugam), e começa a ter um caso com ela. Esta, contudo, não se contenta em ser apenas uma amante e vai tratar de plantar algumas pulgas atrás das orelhas de Pierre.
Desnecessário dizer que esse triângulo amoroso é mostrado de forma nada convencional, com os encontros e as tensões surgindo naturalmente, como na vida, e filmados com seu habitual estilo econômico, porém preciso, certeiro.
Preto e branco, câmera solta, mas não trôpega, composições muito bem pensadas sem parecerem excessivamente calculadas, interpretações que alternam a discrição com uma espécie de desespero parcialmente contido.
Alguns dos melhores diretores modernos conseguem essa limpeza de expressão visual. Garrel é um deles.
O cineasta da geração de maio de 1968 tem a mão delicada para esse tipo de instituição francesa (o amor louco), assim como procura sempre novos meios de se perguntar o que é a fidelidade.
Alguns momentos do filme, e sobretudo o final, têm aquela espécie rara de poesia que só podíamos encontrar no cinema de Éric Rohmer (de "Minha Noite com Ela" e "O Joelho de Claire") ou nos filmes mais prosaicos de François Truffaut (de "A Noite Americana" e "O Homem Que Amava as Mulheres").
Trata-se de um naturalismo peculiar, comum a esses mestres, como também a outros três diretores que, como Garrel, chegaram tarde demais para fazerem parte da nouvelle vague: Maurice Pialat (mais velho, mas com o primeiro longa apenas em 1968, "A Infância Nua"), Jean Eustache ("A Mãe e a Puta") e Jacques Doillon ("Ponette").
Quem já viu precisa rever. Desta vez no cinema. Valerá a pena.
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