Elza Soares, 87, lança 'Deus É Mulher', em que amplia participações femininas

Seleção de 11 inéditas do álbum fala de temas que, na opinião da cantora, a sociedade cala

São Paulo

Elza Soares, 87, desliza pelas redes sociais em seu smartphone. Passa por um vídeo de Nina Simone e por uma foto na qual um homem branco senta sobre um negro. Ela procurava trechos de um documentário sobre mulheres que sofrem violência no campo. "Até chorei, é difícil se recompor", diz enquanto mostra cenas à reportagem.

A cantora diz estudar com afinco os temas que vocaliza. O calvário e a força das mulheres já haviam sido o alicerce para seu trabalho mais recente, o aclamado "A Mulher do Fim do Mundo", de 2015, e ressurgem em "Deus é Mulher", que Elza lança nesta sexta (18).

O título é um verso da faixa "Deus Há de Ser", composta por Pedro Luís, que arremata a seleção de 11 inéditas do álbum. Filha de uma lavadeira e de um operário, Elza lembra a infância em uma favela carioca e afirma: "Deus tem de ser mulher e mãe".

 

"Tive minha casa metralhada, fui expulsa, não quero mais sair daqui. Tenho receio, temos que ter cuidado para que não aconteça outra vez. É se libertando, gritando, falando. Você está no seu país, na sua terra, no seu chão", diz, em alusão ao exílio com o marido Garrincha na Europa.

A história, que ela vê como uma lição de vida, será lembrados em musical e em livro neste ano. "É a dificuldade da negritude nesse país. Não acredito que tenha passado por tudo isso para chegar aqui e ser essa mulher que grita."

Se nas canções vai direto ao ponto, em questões políticas ela evita fazer críticas específicas. "Falar o quê? Dessa repressão, desse movimento, dessa coisa que ninguém sabe o caminho? É uma encruzilhada. Fecharam as porteiras."

Diz aguardar, mas não em silêncio. "Não me calo nunca e me arrependerei jamais. Me calar como? Sou a cara dessa nação, sou a cara desse país, por que vou me calar? Não tenho culpa de ter nascido aqui."


Discografia básica

'A Mulher do Fim do Mundo' (2015)

O primeiro álbum só de inéditas subverte o samba com canções sobre sexo, negritude e violência.

'Do Cóccix Até o Pescoço' (2002)

O título, que alude ao retorno da cantora após acidente, mostra sintonia com novos compositores e estilos.

'Elza, Miltinho & Samba' (1967)

Em dueto com Miltinho, lançou três antológicos LPs de samba, sendo este o primeiro e o mais famoso.

'O Máximo do Samba' (1967)

Estabelecida como intérprete de samba, grava clássicos do gênero, como "Conversa de Botequim", de Noel Rosa.

'A Bossa Negra' (1961)

Segundo álbum de Elza mostra a cantora moldando sua voz rouca e subvertendo o ápice da bossa nova com samba-jazz.

 

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