Carlos Bozzo Junior
São Paulo

Na 14ª Virada Cultural de São Paulo, o palco Boulevard São João —dedicado exclusivamente para artistas da MPB reinterpretarem álbuns completos de suas carreiras— funcionou como uma espécie de máquina do tempo.

Por ali passaram, domingo (20), às 10hs, Fafá de Belém interpretando seu disco “Água” (1977), com uma banda formada por músicos que favoreceram o flashback, acompanhando a artista com propriedade e respeito. Entre eles, Sandro Haick (violão de sete), e Renato Loyola (contrabaixo).

Quando lançado, há 40 anos, “Àgua” vendeu mais de cem mil cópias, levando quem o comprou a uma viagem pelo Brasil por meio de composições de várias partes do país. Entre elas, “Pauapíxuna”, dos compositores paraenses Paulo André e Ruy Barata (1920-1990); “Raça”, dos mineiros Milton Nascimento e Fernando Brant (1946-2015).

“Leilão”, de Heikel Tavares (1896- 1969) e Juracy Camargo (1898- 1973) é canção composta em 1945, que fala sobre a condição desfavorecida do negro no Brasil, além de "Cidade Pequenina", única música composta pela dupla Caetano Veloso e Roberto Menescal. 

Um clássico do cancioneiro brasileiro, "Ontem ao Luar", de Catulo da Paixão Cearense (1863-1946) está neste disco, 32 anos antes de ter sido gravado por Marisa Monte.

Tudo isso e mais um pouco foi mostrado por Fafá de Belém, para um público avisado pela cantora de que o show seria de um disco “intimista”. Ela mesma estranhou fazer o repertório desse trabalho em um espaço aberto, quando o show caberia mais em um teatro. Contudo, funcionou e bem. O público embarcou, cantou junto e adorou a viagem.

Não foi diferente no show Nação Zumbi Toca “Afrociberdelia”, que aconteceu no mesmo palco, horas depois. Com início marcado para as 13h30, o público foi chegando e lotou, em meia hora, o espaço do Boulevard São João. Cerca de 7 mil pessoas, segundo a produção “o maior público desse palco”, foram transportadas para 22 anos atrás, –1996, ano de lançamento do disco—, com a pegada da banda que traz um som ainda muito atual, nervoso, aliado a um discurso contundente, pedrada, de papo reto.

O público cantou, dançou, gritou, sentiu e parecia expurgar junto com os integrantes do grupo um presente enfadonho. Para isso estiveram a serviço, entre outras músicas, “Etnia”, “Cidadão do Mundo” “Maracatu Atômico”, “Corpo de Lama”, “Sobremesa”, “Um Satélite na Cabeça”, “Samba do Lado”, “Manguetown”, “Baião Ambiental”, “Amor de Muito” e "Sangue de Bairro", música da trilha sonora do filme "Baile Perfumado".

O compositor e pianista João Donato também fez o público viajar no tempo, com muito suingue, no domingo (20), às 16h, com o show João Donato Elétrico no palco Jazz e Instrumental,  montado na rua Sete de Abril com a Conselheiro Crispiniano, no centro da cidade.

O som do espetáculo foi cheio de solos inspirados de trombone, sax barítono, flauta, guitarra e piano elétrico para um público de faixa etária entre 30 e 60 anos, bastante receptivo e que dançou o tempo todo.

Impossível não retornar no tempo com a sonoridade da banda que remetia à dos discos lançados pelo selo de jazz CTI Records, nos anos 1970. A diferença ficava por conta do suingue muito brasileiro.

No final do show, que culminou com “Bananeira” e “Emoriô”, dois clássicos de Donato, todos - músicos e plateia – dançaram e cantaram em clima de uma verdadeira festa popular. Donato, Fafá de Belém e o grupo Nação Zumbi tiveram seus nomes gritados e foram superaplaudidos por gente que sabe ser o tempo mensageiro da verdade. 

Shows de Fafá de Belém, Nação Zumbi e João Donato

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