Ministério da Cultura cobra devolução de verba captada para 'O Som ao Redor'

Filme custou mais do que edital previa; cineasta diz que valor excedente veio de outra captação

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Kleber Mendonça Filho, diretor de 'O Som ao Redor' (2013) - Bruno Poletti/Folhapress
Marco Aurélio Canônico
Rio de Janeiro

Após detectar que "O Som ao Redor" (2013) venceu irregularmente um edital federal de 2009 para filmes de baixo orçamento, o Ministério da Cultura está cobrando do diretor Kleber Mendonça Filho a devolução da verba recebida por ele para fazer o longa.

Atualizado, o valor chega a R$ 2,2 milhões, que deveriam ter sido pagos até o dia 9/5. O cineasta pernambucano, no entanto, não fez o pagamento.

Segundo seu advogado, ele contesta a penalidade, atribuindo-a a um "equívoco de interpretação", e considera a restituição pedida "uma medida desproporcional, injusta e excessiva", dado que o objeto do edital —a realização do filme— foi cumprido.

Considerado pela crítica um dos melhores longas brasileiros desta década, "O Som ao Redor" foi feito com verba pública após vencer um edital do MinC que determinava que só seriam aceitos "projetos com orçamento de, no máximo, R$ 1,3 milhão".

A produtora do filme, contudo, enviou para a Ancine (Agência Nacional do Cinema) um orçamento de R$ 1.494.991 —15% superior ao limite máximo. Após vencer o edital, o filme ainda redimensionou seus custos para R$ 1.949.690.

A discrepância entre o custo total do filme e o limite permitido pelo edital foi detectada pela área técnica da Ancine e informada à Secretaria do Audiovisual, do MinC, em 2010. A irregularidade foi ignorada e "O Som ao Redor" acabou captando R$ 1.709.978.

O caso, no entanto, foi denunciado à ouvidoria do MinC e ao Ministério Público Federal por um servidor da Ancine, o que levou a uma investigação que confirmou que a obra havia recebido recursos "em desacordo com os limites previstos no edital".

Em 9 de abril passado, a empresa do diretor e de sua mulher, Emilie Lasclaux, recebeu uma notificação do MinC solicitando "a devolução do montante de R$ 2.162.052,68, referente ao recurso público utilizado na realização do filme".

O casal tinha dez dias, a partir do recebimento da penalidade, para entrar com um recurso no MinC, mas não o fez.

A Secretaria do Audiovisual reconheceu em documento à Advocacia-Geral da União que o filme descumpriu o edital, mas propôs que a AGU reduzisse a punição, cobrando a devolução apenas do que foi captado além do montante permitido. A AGU não aceitou.

Também foi determinado que a secretaria apure em sindicância interna por que a irregularidade foi ignorada.

Excedente foi captado por meio de outro edital, diz diretor

OUTRO LADO

O advogado do diretor, Fabiano Machado da Rosa, afirma que "a decisão administrativa ainda está em discussão", o que é negado pelo ministério.

Para o advogado, a restituição é "uma medida desproporcional, injusta e excessiva, considerando que inexistem quaisquer indícios de locupletamento, dolo ou prejuízo ao erário, pois o objeto [o filme] foi entregue, o que é incontroverso no processo".

Durante a apuração das irregularidades, Mendonça Filho foi questionado pela Secretaria do Audiovisual e defendeu-se afirmando que "o projeto não ultrapassou o valor de R$ 1,3 milhão de recursos federais" —R$ 1 milhão vindos do ministério, R$ 300 mil da Petrobras.

Segundo ele, os R$ 410 mil que foram captados além do teto estabelecido no edital do MinC vieram de outro edital, do governo de Pernambuco. O cineasta também afirma que esse acúmulo de fontes foi aprovado pela Ancine.

O edital do MinC, no entanto, não fazia distinção entre verbas federais e de outras fontes —ele apenas determinava que o custo total dos projetos concorrentes não poderia ultrapassar R$ 1,3 milhão.

Questionado sobre como agiria após o diretor perder o prazo para ressarcir os valores que recebeu, o MinC afirmou à Folha que o caso está sendo analisado por sua consultoria jurídica, "que pode encaminhá-lo ao Tribunal de Contas da União para que sejam tomadas as providências cabíveis".

O advogado de Mendonça Filho afirmou que ainda é possível recorrer na esfera judicial, mas não confirmou se o fará. "Considerando a boa-fé da produtora e a entrega do objeto, confiamos que a justiça será feita e esse equívoco de interpretação corrigido", escreveu ele à Folha.

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