Descrição de chapéu
Artes Cênicas teatro

'Molière' apresenta visão frívola do reinado de Luís 14

Montagem reduz potencial crítico ao simples deboche e evita paradoxos da dramaturgia

BRUNO MACHADO
São Paulo

MOLIÈRE

  • Quando Qui. a sáb., às 20h; dom., às 19h. Até 29/7
  • Onde Centro Cultural Fiesp - teatro Sesi São Paulo, av. Paulista, 1.313, térreo, Bela Vista, região central. tel. (11) 3146-7439
  • Preço Grátis

A montagem do diretor Diego Fortes para "Molière", de Sabina Berman, busca conciliar elementos aparentemente opostos, a exemplo da comédia e da tragédia.

Os gêneros estão representados por dois de seus maiores cultores: respectivamente, o dramaturgo que dá nome ao espetáculo (Matheus Nachtergaele) e seu pupilo, Racine (Elcio Nogueira Seixas). No século 17, ambos disputavam o patrocínio real de Luís 14 (Nilton Bicudo), cujo extravagante reinado quase levou o Tesouro francês à ruína. O monarca era famoso pela generosidade dispensada aos artistas que frequentavam sua corte em Versalhes.

Assim, irrompe em cena a figura do artista refém do patrocinador e do Estado, instituições aglutinadas na figura do arcebispo Péréfixe. O personagem de Renato Borghi faz as vezes de conselheiro, censor e, sobretudo, engendra a disputa entre os autores de "Tartufo" e "Fedra", além de estabelecer um diálogo entre a dramaturgia e os cenários artístico e político brasileiros.

Borghi se destaca ao conseguir esquivar-se da caricatura. O elenco de nomes estelares tem rendimento irregular —resultado da escolha da direção pelo exagero que, contraditoriamente, resulta em atuações pálidas, personagens inexpressivos.

Cenários, figurinos e iluminação, como conjunto, não constituem unidade estética, causam ruído e em nada colaboram para o andamento da narrativa. Frequentemente, o palco parece abarrotado, e o espectador tende a perder-se em informações justapostas. A colagem de influências segue um estranho percurso, que vai do "Moulin Rouge" de Baz Luhrmann à tropicália.

A estética tropicalista reaparece nas canções de Caetano Veloso —que soam deslocadas e gratuitas— e na tentativa de carnavalização do rigor estético presente na produção artística da França sob a égide de Luís 14, a exemplo dos princípios aristotélicos que guiavam a criação teatral.

O olhar, no entanto, parece frívolo; reduz o potencial crítico ao simples deboche. Também é inocente ao idealizar Molière como figura libertária, precursora do desbunde. A tensa relação entre o artista e aqueles que o custeavam tem tratamento superficial.

As polaridades, ainda que presentes, são pouco tensionadas. Como resultado, as contradições são pouco evidentes e a conciliação de opostos não se consuma para além da supressão entre os limites da comédia e da tragédia.

A direção evita enfrentar os paradoxos sugeridos pela dramaturgia. Prefere acrescentar outras e desarticuladas camadas ao texto —mas não as justifica. A maioria delas parece verniz estético que, ao invés de ocultar as deficiências da montagem, as evidencia.

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