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Cinema

Possibilidade alegórica ou crítica se esvai em 'Lua de Júpiter'

Diretor húngaro fica tão fascinado com a tecnologia que deixa de se perguntar a que ela serve

filme Lua de Júpiter
O ator Zsombor Jéger em cena de 'Lua de Júpiter' - Divulgação
Cássio Starling Carlos

Lua de Júpiter (Jupiter Holdja)

  • Quando Estreia na quinta (31)
  • Classificação 14 anos
  • Elenco Zsombor Jéger, Merab Ninidze, Gyórgy Cserhalmi
  • Produção Hungria/Alemanha, 2017
  • Direção Kornél Mundruczó

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A referência a Júpiter no título do novo filme do húngaro Kornél Mundruczó (o mesmo do apocalíptico “Deus Branco”) pode enganar quem busca escapar numa aventura rumo a outros mundos.

O letreiro na abertura do filme informa que “Júpiter possui 67 luas conhecidas. Uma delas pode ter um oceano sob sua superfície congelada e esconder novas formas de vida. Essa lua ganhou o nome de Europa”.

A evocação de outro mundo funciona, portanto, para abordar o nosso mesmo, como de hábito na ficção científica. É o que confirma a primeira cena, na qual se vê a chegada de um grupo de refugiados a um território onde é recebido de forma violenta.

Mundruczó filma a situação com um realismo brutal, colocando-nos no lugar de pessoas que costumamos considerar apenas como o outro, o alienígena, o invasor.

A situação seguinte encaminha o filme para o registro fantástico, agregando uma dimensão religiosa e metafísica ao personagem de Aryan, jovem sírio com poderes que fazem dele uma espécie de anjo, de Jesus reencarnado ou de super-herói da Marvel.

Os estranhos poderes do rapaz logo serão descobertos por um médico beberrão, que estabelece com o jovem um vínculo de proteção e exploração.

Por meio desses elementos, Mundruczó figura a tensa chegada em massa de refugiados sírios nas bordas da Europa no ano passado e o tratamento de intolerância aplicado pelo governo húngaro. Ao mesmo tempo, o filme expande a dimensão factual com uma parábola sobre a santidade e o milagre, expandindo o dado real com algo que vai além e se volta contra ele.

Na vertente realista, “Lua de Júpiter” provoca impacto com a imersão em campos de refugiados, imagens duras que aproximam a Europa atual de um tempo que se supunha ultrapassado. A sensação onipresente de degradação e medo também confirma a desenvoltura de Mundruczó de fundir familiaridade e estranhamento, de transformar o mundo em espaço mental opressivo, com resultados próximos aos dos primeiros Lars von Trier.

Já no lado fantástico, o filme recai na tendência atual de acumular efeitos, com imagens virtuosísticas que saturam os sentidos, mas terminam no vácuo, e uma narrativa em que as explosões terminam em apagões.

Assim, toda a possibilidade alegórica ou crítica se esvai à medida que o diretor húngaro fica tão fascinado com a tecnologia que deixa de se perguntar a que ela serve.

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