Descrição de chapéu Artes Cênicas frank sinatra

Sacralidade do ofício move atriz em musical sobre Bibi Ferreira

Aos 39, Amanda Acosta interpreta dama do teatro brasileiro em temporada que começa nesta sexta (4)

Rafael Gregorio
São Paulo

Amanda Acosta não sabia, mas tinha um encontro marcado com Bibi Ferreira.

A partir desta sexta-feira (4), ela dará vida à artista de 95 anos no espetáculo “Bibi, uma Vida em Musical”, em temporada no Teatro Bradesco após passagem elogiada pelo Rio.

Texto e músicas se concentram na biografia da filha do ator Procópio Ferreira (1898-1979) —um recorte que se confunde com a história do teatro brasileiro.

Amanda Acosta, 39, que interpreta Bibi Ferreira, 95, em espetáculo que estreia temporada nesta sexta
Amanda Acosta, 39, que interpreta Bibi Ferreira, 95, em espetáculo que estreia temporada nesta sexta - Lenise Pinheiro/Folhapress

Foi há 23 anos que a atriz paulistana descobriu a veterana carioca; ganhou de uma professora de teatro uma fita com um registro de “Gota d’Água” (1975), musical de Chico Buarque e Paulo Pontes.

Tudo fez sentido, diz. “Eu imaginava as cenas para depois apresentá-las em saraus.”

O arrebatamento também inspirou a jovem criada em Itaquera, na zona leste de São Paulo, a explorar o universo do teatro e dos musicais.

Já são 25 peças, duas novelas e quatro filmes em carreira que começou cedo —Amanda foi vocalista do grupo infantil Trem da Alegria de 1988 a 1993.

Nos anos que se seguiram, houve outras intersecções entre sua trajetória e a da dama do teatro brasileiro.

Em 2007, Amanda protagonizou a mais recente montagem de “My Fair Lady”, musical que, em 1962, Bibi interpretou com Paulo Autran (1922-2007).

“Nessa época, encontrei a Bibi em um camarim após um show dela. Ela pegou nas minhas mãos, olhou nos meus olhos e disse: ‘Isso é trabalho, minha filha. Muito trabalho’.”

Incessantes esforços marcaram a carreira de Bibi, que, aos 22 anos, já reunia em sua própria companhia nomes como Cacilda Becker (1921-1969) e Maria Della Costa (1926-2015).

É tudo revisitado no espetáculo, desde os 19 anos até as épocas recentes, quando a diva alternou-se entre shows dedicados a nomes como Édith Piaf (1915-1963) e Frank Sinatra (1915-1998) e a direção de peças.

“Estava tenso, sim, sobre o que ela acharia a respeito da maneira como contei a história dela; além de ser a maior estrela do Brasil, é uma grande amiga, e muito crítica”, diz o diretor Tadeu Aguiar, agora aliviado: Bibi gostou.

Segundo ele, que no musical dirige outros 17 atores, como Leo Bahia e Luísa Vianna, a escolha pela protagonista do musical priorizou três critérios: caráter, aptidão e qualidade.

“Ela tem o tipo físico perfeito para fazer a Bibi: é baixinha, elétrica, tem vivacidade e temperamento fortes. É brava e estuda sem parar.”

MENOS METAFÍSICA, MAIS LABUTA

Trabalho, trabalho, trabalho, sempre ele: “O artista jovem tem uma vaidade, mas é preciso aprender com Bibi que teatro não é o tapete vermelho; teatro é varrer o palco”.

Amanda, que adotou como um mantra o que Bibi chama de “sacralidade do ofício”, viu a convivência ficar mais frequente após o episódio do camarim: viram peças uma da outra, homenageou-a em um show.

Ambas calçam 35 e começaram cedo; Bibi aos 24 dias de vida, quando substituiu uma boneca de pano em uma peça; Amanda, um pouco mais tarde.

“Sempre cantei, dancei, interpretei. No quintal de casa, mesmo; juntava gente.”

Juntava mesmo, e uma dessas pessoas era um vizinho que trabalhava na televisão. Ele sugeriu ao pai dela levar a garota, aos 4 anos e meio, para se apresentar —ao vivo— no programa do Raul Gil.

Ela interpretou “Ursinho Pimpão”, da banda A Turma do Balão Mágico. Do episódio, duas lembranças dão timbre ao inconsciente da artista:

“Meu pai me fez uma roupinha com lantejoulas, e me lembro de gostar daquele brilho. Lembro também de chorar no palco porque errei a letra. Desde cedo me cobro demais.”

A dois dias da estreia em São Paulo, a artista parece embebida da personagem, e chega a ser difícil separar atriz e ídolo na sua percepção sobre o fazer cênico:

“O teatro é sagrado, um momento em que se resolve questões de vida. É a salvação da humanidade.”

Mas uma hora acaba a temporada; e aí, o que vem?

“Retomar meu show [de música popular], dirigir uma peça, estudar Carmem Miranda, interpretar um clássico —“um Ibsen, um Shakespeare”— ou gravar um disco com canções do Juninho Bill.”

Ele mesmo, o ex-colega do Trem da Alegria, de quem é amiga desde os tempos de infância trabalhadora.

“Um dos grandes compositores brasileiros”, afirma, e cantarola trecho de uma canção chamada “Mudo”.

Prestes a completar 40 anos, Amanda tem expectativas de chegar aos 95 trabalhando, como Bibi?

“Só espero ficar em paz comigo, e, logo, estar em paz com o mundo. O outro é muito importante para mim.” Longa pausa. “E o outro me machuca muito também.”

 

BIBI, UMA VIDA EM MUSICAL

Teatro Bradesco - Shopping Bourbon - r. Palestra Itália, 500. Qui., 19h, sex. e sáb., 21h, e dom., 20h, até 1º/7. Ingr.: R$ 65 a R$ 150 (uhuu.com). 10 anos.

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