“Onde Está Você, João Gilberto?” apenas finge ser um documentário sobre o hoje recluso grande cantor da bossa nova. Na verdade, o foco do diretor franco-suíço Georges Gachot é a obsessão do escritor alemão Marc Fischer pela figura de João.
Destaque do Festival In-Edit Brasil, este é o décimo documentário do cineasta, numa carreira que aborda o universo musical e, em quatro títulos, a MPB. Gachot passou algumas semanas no Rio refazendo a peregrinação que Fischer cumpriu na década passada para escrever “Ho-Ba-La-Lá”. O título do livro é o mesmo da canção que João Gilberto gravou em 1959.
Fischer, que morreu poucos dias após a publicação do livro, em 2011, era obcecado pela música e queria não apenas encontrar João Gilberto, mas convencê-lo a tocar “Ho-Ba-La-Lá” no violão, diante dele. Missão ingrata.
Para a apuração do livro, Fischer contou com ajuda da brasileira Rachel Balassiano, intérprete que ele chama carinhosamente na obra de Watson, já que o alemão acreditava ser um Sherlock Holmes decifrando o mistério do músico baiano.
Em seus primeiros 30 ou 40 minutos, “Onde Está Você, João Gilberto?” patina sem sair do lugar. Os passeios do diretor-narrador pelo Rio, citando trechos do livro de Fischer, são tediosos. Quem sabe alguma coisa sobre a vida de João não encontrará nada atraente nesse preâmbulo exagerado.
Apenas quando assume os mesmos métodos do alemão é que Gachot traz alguma temperatura ao filme. Ele conversa com os mesmos interlocutores procurados por Fischer. Entre eles, Miúcha, João Donato, Roberto Menescal, Marcos Valle e o barbeiro que cortava o cabelo de João a domicílio.
Esperar por novidades é colher decepção. Nada inusitado é extraído desses encontros. Então, é a verve de cada um que valoriza mais ou menos esses depoimentos. Miúcha fica restrita a comentários carinhosos sobre o ex-marido, e Donato trava em sua habitual timidez.
Cabe a Roberto Menescal e Marcos Valle os momentos mais divertidos. Há anos que os dois são praticamente os oradores “oficiais” sobre as histórias saborosas da bossa nova. No filme, cumprem o papel, apesar do distanciamento que cada um tem em relação a João Gilberto. Menescal falou com ele pela última vez em 1962. Mais ou menos durante o mesmo período, Valle teve uma longa conversa por telefone com João. E só.
Até a cena final, momento poético no hotel Copacabana Palace, as idas e vindas de Gachot e a insistente repetição de trechos do livro desafiam o espectador. É preciso ter paixão por João Gilberto para persistir nessa maratona sem nada de novo a mostrar.
Quem deseja os primeiros contatos com João Gilberto e a bossa nova pode procurar os livros de Ruy Castro, com certeza uma opção mais prazerosa. Ou mesmo o irregular “Ho-Ba-La-Lá”, de Fischer, lançado no Brasil pela Companhia das Letras. O filme de Gachot é apenas para verdadeiros órfãos de João.
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