Montagem inédita de 'Alcina' resgata exuberância barroca

Ópera de Händel, que estreia hoje, trata de mulher que enfeitiça os amantes

CAMILA FRESCA
São Paulo

Uma feiticeira que reina numa ilha e seduz jovens guerreiros para fazer deles seus amantes. Mas, quando se cansa do romance, transforma-os em rochas ou animais selvagens.

Esta é a poderosa Alcina, personagem da ópera de mesmo nome de Georg Friedrich Händel (1685-1759) em cartaz no Theatro São Pedro a partir desta sexta (22).

Um dos últimos sucessos operísticos do compositor, a obra foi composta em 1735, com base em trechos de "Orlando Furioso", de Ludovico Ariosto, e é um dos melhores exemplares da ópera feita no período.

Tudo muda na vida de Alcina quando ela enfeitiça Ruggiero e acaba se apaixonando por ele. Quando se vê abandonada pelo amado vem a grande ária da obra: "Ah, mio cor!".

"Perde o amor mas crê que ainda possui os poderes mágicos. Na ária seguinte, no entanto, ela se dá conta que perdeu todos os poderes", conta a soprano Marília Vargas, que interpreta o papel.

"Este para mim é o grande momento da personagem: ela vira humana", completa ela, especialista no repertório barroco.

Alcina é, em sua concepção, uma personagem de "muitas cores" com grande complexidade psicológica e dramática. "É preciso cavar dentro da gente os afetos de uma vida inteira para interpretá-la."

Apesar de marcar a origem do gênero, a ópera barroca é pouco frequente nos teatros líricos do mundo.

"A distância estética contribui para que pouco se aborde esse gênero de obra. Frustra o público tradicional acostumado ao realismo típico da ópera romântica", diz Luis Otávio Santos, que conduz esta montagem (provavelmente a primeira no país) de "Alcina".

"Em compensação, os temas das óperas barrocas são universais e as situações, apesar de estilizadas, são impactantes e se comunicam com o público, com árias sedutoras."

Violinista e regente, Santos também tem formação como cravista e demonstra todas as suas facetas artísticas nesta produção.

Ele lidera a orquestra nas árias e danças a partir do violino e conduz os recitativos no cravo, dividindo com outro cravista. "Foi a forma que encontrei de participar mais ativamente. Estou do começo ao fim sendo o fio condutor da ação musical", afirma.

Se é verdade que a ópera barroca está longe do modelo italiano do século 19, o fato de trabalhar com elementos fantásticos é "um prato cheio para o encenador", nas palavras de William Pereira, que responde pela direção e cenografia da montagem.

A ação se situa em tempo indeterminado, explora tons neutros e aposta em elementos futuristas, com um toque de "Star Wars".

"A música de 'Alcina' é tão maravilhosa que te dirige, é só não brigar com ela", diz ele, que criou imagens a partir de luz e elementos cênicos e procurou fugir do realismo. "O barroco tem na essência o encantamento visual."


Concertos

Alcina

Ópera
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A ópera em três atos do anglo-alemão Händel estreou em Londres em 1735. A obra é baseada no poema épico do século 16

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