Descrição de chapéu
Livros Flip

Assistente de Hilda Hilst faz papel lastimável ao se apropriar do protagonismo

Yuri Vieira foi secretário da "Senhora H" por dois anos e narra a experiência

Marcella Franco

O Exorcista na Casa do Sol

  • Preço R$ 42,90 (238 págs.)
  • Autor Yuri Vieira
  • Editora José Olympio

Como acontece sempre que um autor é homenageado em um festival de grande porte, é natural o movimento de editoras despejando no mercado reedições e material inédito, bem como do público, ávido pelas novidades.

Não seria diferente com Hilda Hilst, tema da Flip (Festa Literária Internacional de Paraty) 2018, de quem grande parte das obras se encontra, agora, disponível, e sobre quem passou-se a escrever mais do que havia muito não se escrevia.

Nesse embalo, é publicado "O Exorcista na Casa do Sol - Memórias do Último Pupilo de Hilda Hilst", sobre a experiência do autor, o escritor Yuri Vieira, como secretário da "Senhora H" por dois anos, em 1999 e 2000.

Narrado em primeira pessoa, o relato do autointitulado caçula da turma de Hilda se propõe a narrar o cotidiano da residência —localizada no interior de São Paulo— para a qual ela se mudou em 1966.

Autor e editora avisam que não se trata de uma biografia de Hilda, mas, sim, um "testemunho" produzido a partir de material reunido à época por Vieira em anotações pessoais.

O resultado é uma prosa bem construída e interessante aos admiradores de Hilst, que verão alimentado o carente lado voyeur comum a qualquer fã fervoroso. O problema está, no entanto, na sensação transmitida pelo autor de que a magistral e emancipada figura da autora se engrandecia quando em companhia de sua então juvenil figura.

"Como me saí?", perguntaria Hilda Hilst depois de receber uma visita, a fim de validar seu comportamento pela avaliação do assistente.

Atuações prodigiosas em meio à rotina da Casa do Sol colocam Vieira na liderança de decisões, por exemplo, que teriam evitado catástrofes em um nível magistral, incluindo visitantes "chapados" e de faca na mão, ameaçando convivas de morte enquanto preparavam o almoço.

"E uma lâmpada, vista apenas por mim, acendeu sobre minha cabeça", frisa, ao apontar a importância que teve na solução de mais um dos imbróglios na residência, enquanto um relato vaidoso a respeito de uma experiência particular em uma cachoeira é usado para comentar o momento épico em que uma encalorada Hilst trabalhou com os peitos de fora em sua companhia —e que, sozinho e sem enfeites, já seria fascinante.

Vieira tem em mãos um arsenal invejável de episódios compartilhados com uma das escritoras mais exuberantes da literatura nacional, e este simples privilégio seria material suficiente para um livro sedutor.

Há histórias bem escritas e curiosas, e a lástima se dá quando o autor se apropria do papel de protagonista. Vale a leitura para os curiosos sobre a Senhora H, e para os interessados na biografia do escritor Yuri Vieira.

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