Cinebiografia privilegia lado aventureiro de escritor francês

Em retrato pobre, filme sobre Romain Gary deixa de lado as angústias e ambiguidades do homem

Alexandre Agabiti Fernandez

PROMESSA AO AMANHECER (LA PROMESSE DE L’AUBE)

  • Quando Estreou na quinta (26)
  • Classificação 14 anos
  • Elenco Pierre Niney, Charlotte Gainsbourg, Didier Bourdon e Jean-Pierre Darroussin
  • Produção França, 2017
  • Direção Eric Barbier

Considerado um dos mais estacados escritores franceses da segunda metade do século 20, Romain Gary (1914-1980) foi um autor complexo e prolífico, tão talentoso quanto atormentado.

Baseado no romance autobiográfico homônimo publicado em 1960, o filme retraça cronologicamente o período que vai da infância difícil de Gary na Polônia, quando ainda se chamava Roman Kacew, até seu engajamento como aviador durante a Segunda Guerra Mundial em Londres, leal ao general De Gaulle.

No meio disso, sua vinda para a França em 1927, ao lado da mãe Nina (Charlotte Gainsbourg), uma atriz frustrada de origem russa. Nina é a típica mãe judia, superprotetora e exigente. Criou o filho sozinha e projetou nele seus profundos desejos de grandeza e sucesso que o sufocaram durante anos.

Apesar das adversidades que teve de enfrentar, Nina sonhava vê-lo escritor, embaixador, herói dos ares. Não viveu o suficiente para vê-lo realizar esses sonhos sucessivamente, mas Gary parece ter vivido para realizar os desígnios da mãe, para vingar as humilhações que ela sofreu.

Realizada com grande orçamento, a adaptação de Eric Barbier enfatiza a ação, o ritmo intenso, algo que não surpreende em um diretor e roteirista afeito a thrillers.

Ao privilegiar a sequência de peripécias, encadeadas numa cadência de tirar o fôlego —com destaque para as recriações cheias de realismo das batalhas aéreas—, Barbier deixa em segundo plano os mistérios, as ambiguidades e angústias do escritor —aspectos que fazem a riqueza do livro.

O retrato que emerge é necessariamente pobre: destaca-se o Gary aventureiro e herói de guerra em detrimento do homem. Os contornos melodramáticos que tomam a parte final também deixam clara a intenção de Barbier: fazer um filme popular, para um público pouco familiarizado com o escritor e sua obra.

A interpretação de Pierre Niney tampouco consegue colocar alguma nuance a esse fluxo avassalador, enquanto Charlotte Gainsbourg se sai bem no papel da mãe enérgica e obstinada, em que pese o sotaque russo algo forçado.

Sua relação com o filho, praticamente onipresente ao longo da narrativa, é outra opção questionável de Barbier que também empobrece o resultado.

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.