O primeiro contato, mais de 30 anos atrás, foi um choque. Numa escala de voo rumo ao paraíso prometido de Bali, o jornalista Zeca Camargo desembarcou no purgatório da Índia, dona de pobreza que não lhe passou invisível. Um almoço, contudo, o fez mudar de opinião.
“Quando viajamos temos a péssima mania de nos apoiar nas primeiras impressões, mas temos que embarcar de braços abertos. A curiosidade vai te fazer tirar lições”, disse Zeca ao público que encheu a Casa Folha na tarde desta quinta (26), durante a programação da Flip (Festa Literária Internacional de Paraty).
O tal almoço foi a porta para que ele desbravasse o país da vaca sagrada pelo estômago. Oito viagens depois, ele lança “Índia: Sabores e Sensações” (Companhia das Letras), livro escrito em parceria com o empresário indiano Varunesh Tuli, seu amigo.
A obra, lançada na Flip, compila impressões de viagem e receitas vegetarianas daquela culinária, um “baú a ser aberto”, segundo Zeca.
“As receitas são dele, os textos de viagem são meus”, afirmou o jornalista. Ele e Tuli cruzaram cidades como Nova Déli e Mumbai à procura da típica comida indiana, consumida no dia a dia. “O brasileiro acha que ela é muito apimentada, mas não é. É, sim, condimentada.
Tuli falou sobre o hábito indiano de se consumir comida fresca todos os dias. “Porque o calor que temos ali é infernal”, disse. Isso também explica a abundância de frituras. “É uma sabedoria deles: num lugar que não tem muita refrigeração, come-se muito assim”, segundo Zeca.
À certa altura da conversa, ambos falaram sobre a falta de bons restaurantes indianos no Brasil e uma possível integração das culinárias. “Vocês são um país tropical, nós também somos”, afirmou Tuli.
Zeca apontou coincidências históricas entre as trajetórias das duas nações. Em Goa, ex-colônia portuguesa na Índia, diz ter provado um “primo-irmão do sarapatel” e também feijoada num restaurante chamado Fantasias no Cantinho da Vovó.
Os dois também falaram de experiências como a de comer num templo sikh, religião que obriga seus seguidores a oferecer comida a todos. Lá, com uma camisa fazendo as vezes de turbante, o jornalista diz ter sentado no chão para receber comida (vegetariana) servida em pratos de alumínio.
“Tudo ali, comida e religião, são parte do cotidiano”, disse Zeca. “Lá me parece que não se tem café da manhã, almoço e jantar. Come-se o dia todo.” Ao que Tuli emendou: “Porque o tempo não existe na Índia.”
Segundo o indiano, os traços de Zeca o fazem ser confundido com um local se. “As pessoas olhavam para ele e começavam a falar em hindi”, contou Tuli.
Para abrir o apetite da conversa, anunciada como uma “viagem de sensações”, Zeca chamou uma dançarina para anteceder sua fala. O aperitivo, no caso, foi uma apresentação de odissi, dança típica indiana, feita pela brasileira Sonia, mulher de Tuli. Ao som de cítara, ela despejou pétalas pelo palco e saiu aplaudida.
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