A escritora francesa Catherine Millet voltou a fazer duras críticas ao movimento feminista #MeToo durante palestra realizada dentro do projeto Fronteiras do Pensamento, em São Paulo. O encontro aconteceu na noite desta quarta (4), no Teatro Santander.

Autora de “A Vida Sexual de Catherine M.” (2001), livro autobiográfico no qual narra uma rica vida sexual, incluindo orgias e sexo com desconhecidos, Millet foi uma das autoras do “Manifesto das Mulheres Francesas”: publicado no jornal Le Monde em janeiro deste ano, o documento defendia a “liberdade de importunar”.

Era o contraponto às diversas denúncias feitas por mulheres ligadas ao cinema e à TV nos Estados Unidos e que atingiram homens poderosos de Hollywood, como Harvey Weinstein.

Para Millet e outras coautoras do manifesto, um dos problemas do #MeToo é que tem sido dada a mesma gravidade para atos de diferentes naturezas (do estupro e o assédio à cantada inconveniente), o que abriu espaço para um série de injustiças ou uma caça às bruxas.

“Algumas militantes do movimento #MeToo até tiveram escrúpulos para admitir que alguns dos acusados poderiam ser inocentes, mas a hesitação delas foi desconsiderada por outras mulheres sob o pretexto de que não se faz um omelete sem que se quebrem alguns ovos”, disse Millet.

Ela elencou casos em que o contato físico durante uma cantada ou mesmo uma forma de expressão verbal foi considerada pela denunciante um ataque à integridade física. 

A escritora também criticou a imprensa francesa por ter dado espaço que considera demasiado ao assunto, contestou trechos lidos em fóruns feministas na internet e apontou a ausência de investigações mais aprofundadas nos jornais franceses em que a versão dos acusados fossem contemplas. 

Em uma das citações que extraiu dos debates virtuais, uma feminista admitia o risco de difamar homens inocentes e mesmo assim manifestava seu apoio à contínua onda de denúncias.

“Uma mulher que se expressa tão livremente hoje, espero que ela tenha consciência de que vive na França do início do século 21 e não na União Soviética do século 20, onde prevalecia o pensamento de que os fins justificam os meios”, disse Millet.

Ela amplificou o tema para a identificação de um ambiente censor criado por ativistas. Disse que foi formada em um ambiente em que a censura era atribuída aos conservadores e à direita. 

“Hoje, temos um novo adversário. Intelectuais, universitários, jornalistas. E muitos deles se consideram de esquerda e se dizem progressistas”, disse.