Memorial promove Festival de Cinema Latino-Americano e segue luta identitária

Mostra busca oferecer um panorama da produção do continente e vai até o dia 1º de agosto

 
INÁCIO ARAUJO
São Paulo

A América Latina é uma ficção, acreditava o argentino Jorge Luis Borges. O Mercosul por vezes parece feito para provar essa crença. Mas o Memorial da América Latina existe, está lá e luta bravamente por nossa identidade latino-americana.

Disso é a prova o 13º Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo, que começa nesta quarta-feira (25) e prossegue até o dia 1º de agosto.

A mostra, que busca oferecer um panorama da produção do continente, neste ano põe em relevo a produção chilena, da qual selecionou quatro títulos, mas, claro, é o Brasil que acaba mostrando o maior número de filmes, com ficções como o promissor "A Mata Negra", de Rodrigo Aragão, cineasta que tem se destacado no terror a partir de produções modestas.

O setor de documentários registra o trabalho de dois artistas plásticos significativos: "Nelson Felix - Método Poético para Descontrole de Localidade" registra o encontro do artista plástico com o cineasta Cristiano Burlan, que assina a direção do filme, enquanto "Tunga, o Esquecimento das Paixões", de Miguel de Almeida, busca interpretar vida e trabalho do escultor brasileiro (1952-2016).

Entre os demais filmes estrangeiros, o mais promissor é "Outra História do Mundo", coprodução internacional, mas concretamente um filme uruguaio. Guillermo Casanova, seu diretor, consegue tirar efeitos cômicos da dura ditadura em seu país (verdade que a toma já em seu momento terminal), quando dois amigos, por farra, resolvem roubar uma coleção de anões de jardim do coronel que domina a cidade. Coleção que o homem tem, diga-se, em alta conta.

Pode-se pensar em "Mulheres do Caos Venezuelano", documentário de Margarita Cadenas, como um momento a reter, na medida em que busca representar, com as mulheres ali visadas, a situação caótica não só do país vizinho, como do continente sul-americano em geral.

Esses filmes convivem com uma tendência mais frequente do cinema desses países, que é a observação da vida das populações pobres. É o caso de "Correndo Atrás", do brasileiro Jeferson De, que abre a mostra.

Trata-se, ali, de observar a vida de pessoas vivendo na favela ou na periferia, a partir de Ventania, vendedor ambulante de boa conversa e bem-humorado, capaz de levar no bico seus múltiplos credores.

O princípio de fazer uma comédia a partir de tais elementos é simpático, porém esbarra em vícios frequentes de nossa produção, como a caracterização do "típico pobre" como um sujeito bom e virador (quando não é traficante ou assassino, entenda-se), ligado a uma natureza "nacional" (o futebol, no caso, surge como elemento agregador das várias peças), e que no fundo luta para ganhar a vida etc.

Esse gueto pitoresco que cerca as populações urbanas pobres termina por torná-las, aos olhos dos outros (os ricos, os frequentadores habituais de cinema) seres um tanto exóticos, porém distantes.

A ficção absolutamente esquelética e o esquematismo da direção também não ajudam: a primeira amostra brasileira desse festival é bem pouco convincente.

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