Nova série adapta 'Castle Rock', obra incomum de Stephen King

O seriado, que estreou nos EUA no serviço Hulu, tem dez episódios e produção executiva de J.J. Abrams

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Jeremy Egner
Devens (EUA)

Nas profundezas da penitenciária de Shawshank, um homem está sentado em sua jaula, no escuro. Um segundo homem entra, e acende uma lâmpada. Eles conversam ressabiadamente sobre obrigações vagas e conexões misteriosas; o ar pulsa de tensão. Então a luz se acende...

... E isso é praticamente tudo que posso dizer, porque contar algo mais seria um spoiler, e a verdade é que não estou seguro do que está acontecendo. 

Mas se os detalhes lhe parecem uma história de Stephen King - um encontro intrigante, envolto em mistério e ameaça, se desenrolando em um dos cenários mais famosos das histórias do escritor , é exatamente isso que está acontecendo. Só que não.

Confuso? Bem-vindo a “Castle Rock”, onde nem mesmo as pessoas que produzem a série sabem o que está acontecendo a cada momento. “O pessoal da equipe técnica recebe os roteiros na mesma hora que nós”, disse Bill Skarsgard, um dos astros da série.

Eis o que sabemos: “Castle Rock”, que estreou na semana passada nos Estados Unidos no serviço de streaming Hulu (sem previsão no Brasil), é uma série de 10 episódios cujo produtor executivo é J.J. Abrams, e se baseia em “personagens e locações” de livros de Stephen King. 

A série conta uma história original, sobre o advogado de um condenado a morte, interpretado por André Holland (“Moonlight: Sob a Luz do Luar”), que volta à sua cidade natal quando um jovem, interpretado por Skarsgard, é encontrado em uma jaula dentro de Shawshank. (Calma lá: a cena que vi acontece mais tarde na temporada.)

Cada um deles tem um passado misterioso, como quase todo mundo que eles encontram na cidade de Castle Rock, que os fãs do escritor reconhecerão como cenário de algumas de suas histórias clássicas, entre as quais “Cão Raivoso” (um são-bernardo raivoso que aterroriza uma família), “Trocas Macabras” (o diabo abre uma loja) e “O Corpo”, transformada em uma das mais admiradas traduções do trabalho de King, no filme “Conta Comigo”, de Rob Reiner.

“Castle Rock” faz por King o que “Fargo”, de Noah Hawley, fez pelos irmãos Coen, no canal FX: transforma uma força criativa de alcance amplo mas estética distintiva em um gênero por si só. 

A ideia é a de usar uma das cidades macabras do Maine que o escritor tanto ama como polo para conectar todas as histórias - os personagens, os monstros, as lendas -, dentro de um universo múltiplo que sirva de pano de fundo a uma série de TV de primeira linha.

“Sempre amei a ideia de que aquela cidade era o território mais azarado do planeta”, disse Sam Shaw, criador da série, com Dustin Thomason.

Com a provável exceção de Shakespeare, King é o autor favorito de Hollywood há décadas, e agora que “A Coisa” se tornou um dos filmes de terror mais lucrativos da história, os roteiristas se deixam atrair ainda mais pelas histórias dele. 

No momento, há mais de uma dúzia de adaptações de obras de King em algum estágio de desenvolvimento, e suas impressões digitais estilísticas estão cada vez mais presentes na televisão - uma mídia que vem dedicando atenção cada vez maior aos gêneros narrativos estabelecidos. Também existem programas que o homenageiam explicitamente, como “Stranger Things”, uma série de aventuras que se passa nos anos 80 e chega até a usar a fonte preferida do escritor na grafia de seu título (ITC Benguiat, se você quiser saber.)

Da mesma forma que Castle Rock, a cidade amaldiçoada, serve como nexo topográfico para o universo de ficção do escritor, “Castle Rock”, a série, representa uma convergência de tendências de TV contemporâneas. É uma série em formato de antologia, que pretende contar uma história diferente ao longo de cada temporada (a exemplo de “American Crime Story” e “Fargo”); cada temporada futura trará uma linha narrativa e um elenco diferentes. 

A série também se enquadra no formato “mystery-box”, (como “Westworld” e Mr. Robot”), por ser um enigma que a audiência deve solucionar, além de uma série de TV. E seu objetivo é criar um novo universo na cultura pop, inspirado pelo pendor duradouro de King a revisitar personagens e locações, e inserir referências cruzadas em suas muitas histórias.

Muito antes que a Marvel e a DC criassem universos cinematográficos, “Stephen King fazia o mesmo nas páginas de seus livros”, disse Thomason.

“Fargo” foi o exemplo que os criadores do programa —romancistas há muito tempo obcecados por King, que colaboraram anteriormente no subestimado drama atômico “Manhattan”— usaram ao propor “Castle Rock” a Abrams. Também grande fã de King, este já havia adaptado “Novembro de 63”, outro romance do escritor, que gira em torno de viagens no tempo, como série para a Hulu.

Mas diferentemente do livro, uma narrativa de ficção científica histórica que gira em torno do assassinato do presidente John Kennedy, “‘Castle Rock’ parecia o Stephen King clássico, o Stephen King pelo qual me apaixonei”, disse Abrams. 

“Amei as perpétuas possibilidades, tudo aquilo que os fãs de King poderiam encontrar atrás de cada porta, quem tal personagem poderia ser, a quem esses personagens se relacionariam, em que eles poderiam ter estado envolvidos”.

The New York Times, tradução de Paulo Migliacci

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