Descrição de chapéu Artes Cênicas

Sete atrizes interpretam Elza Soares polifônica em musical dedicado a ela

Espetáculo estreia no Rio com arranjos da Orkestra Rumpilezz e texto de Vinicius Calderoni

Luiz Fernando Vianna
Rio de Janeiro

Ao saber, neste ano, que seria representada por sete atrizes num musical sobre sua história, Elza Soares disse de imediato: "Sete vidas!". Tratar a cantora como alguém que renasceu várias vezes é a ideia que move "Elza", musical que estreou nesta quinta no Teatro Riachuelo, no Rio.

"Não conheço outra pessoa que tenha vivido tantas coisas e que esteja aí com a força que ela tem, com o amor que ela tem. Elza gosta de dizer: 'Meu nome é agora'", destaca a diretora Duda Maia.

Maia conquistou prêmios pela encenação de "Auê" (2016). Ela retoma a parceria com a produtora Andrea Alves, da Sarau, também responsável por outros espetáculos premiados, como "Gonzagão - A Lenda" (2013), "Gota d'Água [a Seco]" (2016) e "Suassuna - O Auto do Reino do Sol" (2017).

O texto de "Elza" é do músico, ator e dramaturgo paulistano Vinicius Calderoni, que ganhou prêmios como autor de "Arrã" (2015) e "Os Arqueólogos" (2016). E a direção musical é de Pedro Luis, criador do verso que dá título ao CD lançado por Elza Soares neste ano: "Deus É Mulher".

"Uma coisa fundamental é que Elza está em atividade. E no seu momento de maior exposição. Acho que é a voz política mais importante na arte brasileira hoje", afirma Pedro Luis, que utiliza cerca de 40 canções na montagem, como "Volta por Cima", "Dura na Queda", "O Meu Guri" e "Maria da Vila Matilde".

Os arranjos são de Letieres Leite, da Orkestra Rumpilezz, e a banda é formada por seis mulheres.

Com "A Mulher do Fim do Mundo" (2015) e "Deus É Mulher", Elza se tornou uma das principais referências quando se pensa em mulher negra no Brasil. Daí a opção por sete atrizes negras: Larissa Luz, Janamô, Júlia Dias, Késia Estácio, Khrystal, Laís Lacorte e Verônica Bonfim.

"Elza sempre teve voz ativa politicamente, mesmo não tendo tanta consciência do que representava. Ela e nós estamos no mesmo processo de nos assumir como mulher preta com voz relevante", diz Luz.

A artista baiana foi a única que optou por aproximar o timbre do de Elza. Embora o espetáculo fuja do realismo e do rigor cronológico, Luz representa a força atual da cantora, enquanto as outras atrizes mostram o caminho dela até hoje, com mais de 80 anos —sua idade nunca foi assumida.

"Ela jamais seria o que é hoje, a mulher do fim do mundo, se não tivesse imbuída de tudo o que viveu. É importante a gente remeter ao passado. Não para ficar chorando, mas para saber de onde a gente veio", ressalta Verônica Bonfim.

"O forte não é o que não cai, mas o que se levanta após cada tombo", completa Janamô.

A peça cita outras mulheres negras, como Marielle Franco, a vereadora carioca assassinada em 14 de março, aos 38 anos. Mas também é alegre. Este foi um pedido de Elza: que o espetáculo não resultasse triste, pois ela não é. A cantora não interferiu no projeto nem assistiu a ensaios.

"Ela conversou com a gente para não ser posta como vítima. As tragédias estão em cena, mas ela sempre aparece com altivez, dignidade", diz Maia.

Calderoni fugiu da biografia linear, que poderá ser contemplada pelo livro que Zeca Camargo está escrevendo.

A peça aproxima, por exemplo, duas quedas: a literal de um palco, em 1999, início dos problemas nas costas que comprometeram sua locomoção; e a simbólica, com a perda de seu filho Garrinchinha, em 1986, aos nove anos, num acidente de carro.

Elza ainda perdeu mais três filhos, passou fome, apanhou do primeiro marido —com quem foi obrigada a se casar quando tinha 12 anos— e foi enxovalhada quando o craque Garrincha deixou a mulher para se casar com ela, dentre várias outras situações após as quais renasceu.

As atrizes também interpretam os personagens masculinos. "Se fosse monólogo, os homens estariam dentro dela. A peça é um monólogo de uma Elza polifônica. É importante serem sete atrizes, pois seria muito peso para apenas uma aguentar", afirma Calderoni.

Elza

Qui., às 19h, sex. e sáb., às 20h, dom., às 18h, no Teatro Riachuelo, r. do Passeio, 38/40, centro. Até 30/9. Ing.: R$ 40 a R$ 150, na bilheteria e em ingressorapido.com.br. 14 anos

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