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Em livro, Yuval Noah Harari retoma pontos de 'Homo Deus', mas sem especulações selvagens

Best-seller mundial, historiador israelense lança dia 30/8 novo livro, '21 Lições para o Século 21'

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O historiador e escritor iraelense Yuval Noah Harari
O historiador e escritor iraelense Yuval Noah Harari - Olivier Middendorp/Divulgação
São Paulo

21 Lições para o Século 21

  • Preço R$ 54,90 (432 págs.)
  • Editora Companhia das Letras

“21 Lições para o Século 21” é o novo livro do historiador israelense Yuval Noah Harari. O título tem todas as digitais de uma encomenda do editor. É improvável, afinal, que, no curso de suas investigações acadêmicas, Harari tenha identificado exatamente 21 problemas que marcam este início do século que, por coincidência, é o 21º da Era Comum.

E tanto o editor quanto o autor tinham motivos de sobra para sair com um novo livro, que tem lançamento mundial previsto para 30/8. As duas obras anteriores de Harari, “Sapiens” e “Homo Deus”, venderam mais de 12 milhões de exemplares em 45 idiomas. Configuraria negligência editorial não aproveitar a popularidade global para lançar um terceiro título.

Apesar dessas circunstâncias não muito promissoras, “21 Lições...” é um excelente livro. Em “Sapiens”, cujo subtítulo é “uma breve história da humanidade”, Harari escarafunchou o passado. Em “Homo Deus”, cujo subtítulo é “uma breve história do amanhã”, ele conjecturou sobre o futuro. Em “21 Lições...”, que não tem subtítulo, se debruça sobre o presente, diagnosticando problemas atuais e propondo, quando cabível, soluções.

Os temas abordados satisfazem a todos os gostos: tecnologia, política, religião, violência, educação, “fake news”, justiça, ficção científica e vários outros. Há momentos bem pessoais, como aquele em que Harari fala sobre sua homossexualidade, e outros que, não resisto em dizê-lo, lembram livros de autoajuda, como os capítulos em que ele faz loas à humildade e à meditação.

Tirando essas excentricidades, reencontramos o melhor Harari, que consegue equilibrar clareza, argúcia e bom senso com uma escrita envolvente, repleta de anedotas memoráveis. Quem já leu as duas obras anteriores experimentará alguma sensação de “déjà vu”, uma vez que as ideias-mestras dos outros livros reaparecem neste.

Na verdade, “21 Lições...” retoma vários pontos de “Homo Deus”, notadamente na questão da tecnologia ameaçando empregos e a própria identidade humana. Mas, o faz de forma bem mais ponderada, sem incorrer nas especulações mais selvagens que marcaram a obra anterior. O horizonte aqui não é o do futuro longínquo, mas o dos próximos anos.

Meu capítulo favorito é o das “fake news”. Ali, Harari mostra que, embora o termo esteja em evidência atualmente, não constitui novidade na história de nossa espécie. Ao contrário até, se há algo que define o Homo sapiens, é justamente sua incrível capacidade de criar ficções e acreditar nelas. Não importa tanto se a notícia falsa é a última mentira de Donald Trump, o valor do dólar (que objetivamente não passa de um pedaço de papel) ou o mito de fundação de um país, crenças comuns compartilhadas são o segredo da cooperação entre humanos e o que nos distingue de outros mamíferos.

Algumas vezes, as “fake news” duram um período breve de tempo e não chegam a ter aceitação universal, como a versão de Putin de que a Rússia não arma nem apoia os separatistas ucranianos. Outras vezes, persistem por milênios, como é o caso das religiões. E o fato de serem ficções não impede que produzam efeitos muito reais, como se vê nos milhares de mortos nos combates no leste da Ucrânia ou nas experiências religiosas dos fiéis, que muitas vezes se dispõem a matar e morrer pelas “verdades” de sua fé.

As soluções propostas por Harari para lidar com o problema são: procure sempre fontes confiáveis de informação, mesmo que precise pagar por isso, e nunca deixe de recorrer à literatura científica relevante. É provavelmente só o que podemos fazer mesmo, mas, se alguém estava em busca de lições arrebatadoras, fica um ar de platitude anticlimática.

Sob esse ângulo, talvez haja algo de “fake” em “21 Lições...”. Mas, ainda que Harari não resolva “de verdade” 21 problemas, o que ele tem a dizer sobre eles certamente vale a pena.

Hélio Schwartsman, jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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