Descrição de chapéu Artes Cênicas

Inez Viana estreia na dramaturgia com debate sobre memória e incompreensão

Atriz apresenta em São Paulo 'A Última Peça', com direção de Danilo Grangheia

Inez Viana em

Inez Viana em "A Última Peça", espetáculo de sua autoria com direção de Danilo Grangheia Elisa Mendes/Divulgação

MLB
São Paulo

"A Última Peça", estreia da atriz e diretora Inez Viana na dramaturgia, é um passeio pela memória. Vai de de lembranças reais a inventadas, de rememorações pessoais ao histórico social.

Coloca em cena uma mãe que escreve uma peça para se aproximar do filho. Mas essa é uma mulher desmemoriada. Não se lembra bem do rapaz nem do que queria narrar.

Ela contrata um professor de francês para não se esquecer da língua (leu no jornal que toda pessoa precisa aprender uma língua ou tocar um instrumento para ativar o cérebro) ou da própria vida.

"É um medo real que eu tenho, de me esquecer, de perder o fio que me liga ao mundo", diz Viana, que estreia o espetáculo nesta quinta (9) em São Paulo. "Mas eu fiz disso uma peça quase simbólica."

Não se trata apenas da ligação entre uma mãe, interpretada por Viana, e seu filho —o ator e diretor francês Thomas Quillardet. A relação de afeto ainda resvala no social: a mãe é também a pátria; a memória, a história de um país.

"Há uma falta de memória na sociedade. Às vezes a gente se esquece do que aconteceu há pouco tempo e repete [atitudes sociais e políticas] ou releva algum fato", afirma a atriz, lembrando casos de tortura durante o regime militar.

É uma forma, comenta Danilo Grangheia, diretor da montagem, de discutir como padecemos da memória e "como estão querendo que a gente se esqueça dessas coisa, da nossa história".

"Mas a dramaturgia consegue, de forma fragmentada, fazer uma síntese do afetivo, do pessoal e do social", diz ele.

Ginete Duque em "A Última Peça", espetáculo de Inez Viana com direção de Danilo Grangheia
Ginete Duque em "A Última Peça", espetáculo de Inez Viana com direção de Danilo Grangheia - Elisa Mendes/Divulgação

Viana passeia pelo real e pelo absurdo. Por vezes, mãe e filho se agridem, matam um ao outro, mas ressuscitam. Há no meio de tudo um francês falado aqui e ali, uma torre de babel, símbolo da incompreensão e da falta de escuta.

Em dado momento, a mãe se transmuta em uma vaca, figura materna e acolhedora, mas também uma força da natureza. "Cansei... Só queria pastar em paz...", desabafa a personagem zoomórfica.

É uma inspiração de Viana em "Metamorfoses", do poeta latino Ovídio, que narra a transfiguração dos homens e dos deuses mitológicos em animais e formas da natureza.

Tudo, enfim, é costurado por metáforas —é a própria autora que está em cena sem conseguir escrever— e em dado momento a mãe de Viana surge em cena. Ginete Duque, 86, que não é atriz, pontua a peça com algumas aparições.

"Ela presentifica coisas que colocamos em cena, é como se eu a evocasse", diz a autora.

Viana, que acaba de dirigir um Nelson Rodrigues inédito ("A Mentira"), prepara com seu grupo OmondÉ a primeira montagem de "O Auto de João da Cruz", de Ariano Suassuna, um "Fausto" brasileiro.

Foi um convite de Dantas Suassuna, filho do escritor, e deve estrear em 2019 na Fazenda Carnaúba, em Taperoá (PB), antigo refúgio do autor.

A Última Peça

  • Quando Qui. a sáb., às 21h30, dom. às 18h30. Até 2/9
  • Onde Sesc Pompeia, r. Clélia, 93
  • Preço R$ 10 a R$ 60
  • Classificação 14 anos
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